Que terrível sonho eu tive com ele!
Entrava num conto que me lembro de ter ouvido. Era um farsante! Saía do seu buraquinho, falava, corria as sete partidas do mundo a intrigar uns e outros, e não passava de um lagarto.
Que noite tão assustada eu passei por causa do senhor da casaquinha verde! Sonhei que estava a dormir com ele. Via-o mesmo ao pé da minha cara e sentia-me cheia de arranhões e babujada.
Mas que havia de eu fazer? Horripilante companhia! Levanto-me repentinamente da cama e atiro-me da janela abaixo. Até parece que voo. Fujo, fujo, fujo... e o senhor da casaquinha verde perseguindo-me.
Começa a chover. Não é água que cai, infelizmente, apesar de eu ter medo da chuva. São bolotas, são pedras, são bugalhos, que me magoam tanto! É castigo, penso eu, estou a ser castigada, mas de quê?
Atrás de mim o lagarto faz uma restolhada medonha, mas eu nunca me volto, nem quero ver nada.
Não quero ver... e sem querer olho... mas como é que não morro logo de susto? Perseguem-me centenas de lagartos, enormes, e todos com os olhos a fuzilar. Que bocarras, que bocarras! Caio de joelhos no chão, falece-me a coragem. Estou num círculo de lagartos ferozes, estou no meio de navalhas afiadas...
Oiço então a voz do senhor da casaquinha verde: queres voltar comigo para a cama?
Ele a falar-me!
Choro, cheia de medo, e o círculo das navalhas aperta-se, aperta-se cada vez mais. Vou morrer. Já morri. Sei que estou morta, o que me não dá alegria nem tristeza. Deixo de pensar nos lagartos, vou descendo não sei para onde. É terrível e delicioso, escorrego sempre, sempre, sem jamais parar.
Acordei cansada. E jurei a mim mesma nunca mais ouvir nem ler histórias de lagartos.
Irene Lisboa

Nenhum comentário:
Postar um comentário