segunda-feira, agosto 8

Faltam livros nas escolas brasileiras

O romance "O menino do pijama listrado", de John Boyne, despertou a paixão de Sidineia Chagas, de 25 anos, pela leitura, quando ela cursava, em 2007, o 1º ano do ensino médio na Escola Estadual Professora Renata Menezes dos Santos. Sidineia mora em Parelheiros, região do extremo sul de São Paulo que lidera rankings de violência e de baixo desenvolvimento humano.

O encontro entre Sidineia e a história de Boyne ocorreu quando cada aluno de sua classe recebeu uma caixa com quatro livros. O mesmo encanto com os títulos não aconteceu com boa parte de seus colegas.“Quando a aula acabou, muita gente rasgou os livros”, diz ela. Sidineia viu páginas virar dobraduras ou munição para guerra de bolinhas de papel.

A atitude dos jovens foi um reflexo do descaso com que a própria escola tratava a leitura. Sidineia afirma que as obras foram apresentadas aos alunos sem o respaldo de qualquer atividade pedagógica que destacasse a relevância delas. Além disso, a biblioteca do colégio nunca atraiu frequentadores. Quase sempre fechado, o espaço funcionava mais como um depósito de livros do que como um ambiente de incentivo ao hábito de ler. O mesmo ocorria nas demais escolas da região de Parelheiros.

Essa realidade precária inspirou Sidineia e outros 30 jovens a criar um espaço de leitura que pudessem frequentar à vontade. Nos fundos do Cemitério do Colônia, uma pequena casa antes abandonada abriga a Biblioteca Comunitária Caminhos da Leitura, fundada em 2009, em parceria com uma ONG, o Instituto Brasileiro de Estudos e Apoio Comunitário (Ibeac). “O objetivo foi criar um lugar que, além de emprestar livros, fosse um ponto de encontro para a comunidade”, diz Sidineia. Com a ajuda de instituições públicas e privadas, hoje a biblioteca conta com um acervo de 4 mil exemplares.

Iniciativas como a de Parelheiros surgem para tapar buracos deixados pelas políticas educacionais do estado. Uma lei sancionada em 2010 determina que, até 2020, todas as escolas do Brasil tenham uma biblioteca. Os números, porém, mostram que a obrigatoriedade não será cumprida dentro do prazo – se é que ela será cumprida algum dia. O Censo Escolar de 2015 mostra que somente 37% das escolas públicas e privadas de educação básica (entre a educação infantil e o fim do ensino médio) têm biblioteca. Para que a meta seja alcançada, 84 bibliotecas teriam de ser abertas diariamente, a partir desta semana e pelos próximos 1.389 dias.

Esses números mostram apenas um dos aspectos de como o incentivo à leitura é negligenciado na educação brasileira. As poucas bibliotecas existentes na rede pública costumam funcionar de forma muito deficiente. Entre 11 escolas escolhidas aleatoriamente na cidade de São Paulo, apenas duas bibliotecas funcionam em período integral e três ficam abertas eventualmente. Em seis escolas, alunos não têm livre acesso ao espaço onde ficam os livros. “A sala fica fechada. Os estudantes só podem entrar quando acompanhados por um professor”, afirma o funcionário de uma das escolas, que não quis ser identificado. O motivo mais comum ao acesso restrito é a falta de um supervisor no local.

Isso não ocorreria se a lei fosse respeitada. As bibliotecas escolares devem contar com a presença de um bibliotecário preparado para organizar, abastecer e gerenciar o acervo. Na contramão do que diz a lei, a rede estadual de ensino de São Paulo passou a substituir, em 2009, a instalação de bibliotecas por salas de leitura.Diferentemente das bibliotecas, essas salas são espaços informais, com acervo diminuto, sem preocupação com iluminação ou organização apropriada para atividades relacionadas ao estudo e à leitura. Outra diferença fundamental da sala de leitura é que ela dispensa a presença de um profissional preparado para receber os alunos. “Um dos papéis do bibliotecário é sugerir ações pedagógicas que tornem a biblioteca um espaço convidativo para os alunos”, diz Maria Aparecida Lamas, educadora especializada em formação de leitores.

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