quarta-feira, outubro 29

Assim começa o livro...

Estava claro o céu, tépido o ar, e as bouças e montados floridos. O mês era dezembro, de 1863, em véspera de Natal.

A gente das cidades, pergunta-me em que país do mundo florescem, em dezembro, bouças e montados.

Respondo que é em Portugal, no perpétuo jardim do mundo, no Minho, onde os inventores de deus teriam ideado as suas teogonias, se não existisse a Grécia. No Minho, ao menos, se buscariam águas limpadas para Castálias e Hipocrenes. No Minho, a Citera para a mãe dos amores. Nos arvoredos desta região de sonhos, de poemas, e rumores de conversarem espíritos, é que os sátiros, as dríades, e os silvanos sairiam a cardumes dos troncos e regatos que tudo aqui parece estar dizendo que a natureza tem segredos defesos ao vulgo, e como a entreabrirem-se à fantasia de poetas.

Mas que flores... quer o leitor saber que flores vestem os calços e denegridos serros do Minho, em Portugal. São flores a festões, cachos de corolas amarelas, viçosas, e aveludadas como as dos arbustos cultivados em jardins; é a florescência dos tojais, plantas repulsivas por seus espinhos, alegres de sua perpétua verdura, únicas a enfeitarem a terra quando a restante natureza vegetal amarelece, definha e morre. E desse privilégio como que o agreste arbusto se está gozando soberbamente; pois que vos amostra as suas pinhas de flores, e com os inflexíveis espinhos vos defende o despojá-lo delas.

E naquele dia 24 de dezembro de 1863 andava eu no Minho, por aquela corda de chãs e outeiros, que abrangem quatro léguas entre Santo Tirso, Famalicão e Guimarães.



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