domingo, março 11

Domingo

Livros & Imaginação
André seria o primeiro a chegar; viria com as crianças, elas todas com aqueles olhos azuis de doer os nossos, a calmaria de lagos, mas no fundo o agito dos oceanos: os três já estavam na idade de perguntar tudo, e espalhavam, como conchas, o constrangimento por onde passavam. Depois, seria a vez de Pedro e a menina, os dois de quase nunca falar; às vezes machucava ouvir o silêncio deles, se não fosse o ruído do motor do carro se acercando, ninguém diria que teriam vindo, mas, sim, se materializado, de repente, no meio da família. Logo saberíamos, pelo latido dos cachorros, que Marcos tinha estacionado; sempre os trazia na caçamba da caminhonete e, mal abria a portinhola, os bracos já saíam correndo, famintos pelas larguezas do campo. João viria em seguida, sempre solteiro, no seu carro esportivo, mas com alguma nova companhia, o que costumava gerar incômodo, apesar de ser um estímulo às boas maneiras. Não tardaria também para a moto de Madalena encostar à sombra do flamboyant, e ela descer falando alto, enfiada numa daquelas calças jeans justíssimas (que reprovávamos), os óculos escuros refletindo cada um de nós na varanda, as crianças brincando sem saber que a vida nelas já ia envelhecendo, todos os meus filhos bebendo seus drinques, felizes pelo momento de leveza. Era um conforto tê-los tão perto, com suas virtudes e seus defeitos, a maioria herdados de nós mesmos. Tão logo fôssemos à mesa, Maria, a mãe deles, sentaria ao meu lado, e eu ocuparia a cabeceira e abriria um sorriso, como das outras vezes, um sorriso que dizia, tudo termina, e era por estar lá com eles, vivendo mais um desses encontros finitos, que eu sorriria.
João Anzanello Carrascoza

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