sábado, março 14

Um pouco de história

Livraria em Londres (1818)
O comodismo da compra pela Internet pode por fim a um milenar passeio de quem gosta de livros. A ida à livraria e a lojas como ponto de encontro com fiéis amigos encadernados de ontem ou do momento, com os nem sempre tão fiéis encapotados, companheiros da mesma paixão. Ir à livraria para vasculhar as estantes ou bate-papo não é de hoje com lojas dispondo de instalações confortáveis, sofás, café e até algumas com computador e segurança. O freguês, desde os tempos romanos, aparecia mesmo por causa de seu grande amigo: o livro.

Os livreiros desde aquela época são os grandes divulgadores do livro a ponto de Plínio, o Moço, se assustar com sua popularidade em Lugdunum, atual Lyon, na França. “Não pensei que houvesse livreiros em Lugdunum, portanto fiquei ainda mais satisfeito ao saber por sua carta que minhas obras estão à venda”. Foram os livreiros de Roma que tornaram autores como Lucrécio, Cícero e Varrão os mais vendidos naquele fim de época entre os anos 87 e 54 antes de Cristo. Não muito diferente do que vigoraria como fachada de livraria até o século passado ao menos, as romanas possuíam “portas cheias de cartazes e títulos de livros, oferecendo aos passantes, à primeira vista, os nomes de todos os poetas”, escrevia Marcial.

O comércio livreiro na Roma tinha até quarteirões onde se concentravam as lojas (tabernae librariae), que colocavam os bustos dos autores mais lidos distribuídos pela sala. Mesmo os muros de Roma serviam para campanha publicitária dos livros com os cartazes da época. Até mesmo iniciativas hoje comuns nas livrarias já eram conhecidas como a leitura de obras. Também os encontros em porta de livraria eram tradicionais em Roma, Reims, Lyon, Marselha e Milão.

O fim do Império Romano provocou o desaparecimento da tabernae que vendia clássicos latinos e gregos e fez surgir o comerciante de livros usados. A Renascença iria provocar o ressurgimento do comércio a ponto de em um só quarteirão de Oxford haver nove lojas no século XII. Em Paris, 14 livreiros oficiais, no século XIV. Pode parecer pouco o número de lojas, mas deve-se Ter em conta o preço do livro, privilégio dos ricos ou da Igreja. Para comprar dois volumes do gramático Prisciano o bispo de Barcelona, no século XI precisou vender uma casa e um terreno.

O surgimento da indústria tipográfica tornou o livro mais acessível ao leitor e os livreiros se espalhavam pelo interior europeu. Abriam lojas em que também vendiam pergaminho, papel, fabricavam tinta e até encadernavam os livros. Surgiu também uma nova forma de livreiro: o colportor, vendedor ambulante que teve muito trabalho e ação entre os séculos XV e XIX. É das livrarias que vai surgir a figura do editor no decorrer dos séculos, como afirmou Roger Chartier: “É em torno da atividade de livraria que se organiza toda a atividade editorial”.

As livrarias, a partir do século XVIII, se afirmam em definitivo. Na Europa, muitas ainda existentes como a Hatchard’s, em Londres, é conhecida desde 1797. Ponto de encontro e local para se passar horas, as livrarias recuperam as mesmas formas de divulgação da antiga Roma. No Brasil, Garnier, Quaresma, Briguiet, Laemmert, Francisco Alves, José Olympio e São José foram livrarias onde a nata da intelectualidade se encontrava todo o dia e muitos com assento garantido para um bate-papo ou saber das últimas novidades editoriais e políticas. Na São José, surgiram as tardes de autógrafos nos anos 50.

A modernidade apenas enfeitou algumas livrarias, acrescentou serviços determinados pela época. O importante é que continuam a estar com prateleiras cheias, espalhando o colorido das lombadas e enfeitando a fantasia dos leitores com os títulos, pois o leitor não dispensa nunca seu passeio pelas casas do livro, local único onde se tem contato direto com o apaixonante livro. 

(Transcrito do extinto Leitores&Livros)



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