sábado, maio 13

As viúvas

Conta Vauvenargues que, nos jardins públicos, existem aleias frequentadas sobretudo pela ambição falida, pelos inventores infelizes, pelas glórias perdidas, pelos corações oprimidos, por todas as almas tumultuosas e fechadas, nas quais ainda ressoam os últimos suspiros de uma tempestade e que escapam para longe do olhar insolente dos satisfeitos e dos ociosos. Esses retiros sombrios são os pontos de encontro dos estropiados da vida.

É principalmente para esses lugares que o poeta e o filósofo gostam de dirigir as suas ávidas conjecturas. Há neles um pasto certo. É que, se um lugar existe que desdenham de visitar, como insinuei há pouco, é sobretudo a alegria dos ricos.
 Essa turbulência no vazio nada tem que os atraia. Sentem-se, ao contrário, irresistivelmente arrastados por tudo o que é fraco, arruinado, triste, órfão.

Uma visão experimentada jamais se engana a esse respeito. Naqueles traços rígidos ou abatidos, naqueles olhos cavos e ternos, ou com o brilho dos últimos clarões da luta, naquelas rugas profundas e numerosas, naqueles passos tão vagarosos ou tão apressados, decifram-se logo as inumeráveis legendas do amor enganado, do devotamento desconhecido, dos esforços não recompensados, da fome e do frio, humildemente, silenciosamente suportados.

Acaso já vistes viúvas nesses bancos solitários, viúvas pobres? Estejam ou não de luto, é fácil reconhecê-las. Aliás, no luto do pobre, há sempre alguma coisa que falta, uma ausência de harmonia que o torna mais pesado. O rico põe o seu sem nenhuma falha.

Que viúva é mais triste e mais entristece, a que leva pela mão uma criancinha com quem não pode partilhar seu delírio, ou a que está completamente só? Não sei... Aconteceu-me, certa vez, acompanhar durante longas horas uma velha aflita dessa espécie; empertigada, direita, debaixo de um pequeno xale usado, demonstrava em todo o seu porte uma altivez de estoica.

Estava evidentemente condenada, por uma solidão absoluta. Aos hábitos dos velhos celibatários, e o caráter masculino dos seus costumes acrescentava uma nota de mistério à sua austeridade. Não sei em que miserável café nem de que maneira almoçou. Segui-a ao gabinete de leitura, e observei-a durante todo o tempo em que, relanceando nas gazetas os olhos outrora queimados pelas lágrimas, procurava notícias de um poderoso interesse pessoal.

Por fim, à tarde, sob um céu encantador de outono, um desses céus de onde descem em profusão as saudades e as lembranças, ela sentou-se à parte num jardim, para ouvir, longe da multidão, um desses concertos com que a música dos regimentos gratifica o povo parisiense.

Foi esse, sem dúvida, o pequeno deboche daquela velha inocente (ou daquela velha purificada), o consolo bem ganho de um dos seus pesados dias sem amigo, sem palestra, sem alegria, sem confidente, que Deus deixava cair sobre ela, há tantos anos talvez! Trezentas e sessenta e cinco vezes por ano! Agora uma outra: Nunca pude deixar de volver o olhar, se não universalmente simpático, ao menos curioso, sobre a multidão de párias que se cumprimentam ao redor do recinto de um concerto público. Através a noite, a orquestra espalha canções festivas, de triunfo ou de volúpia. Destacam-se vestidos que se arrastam. Cruzam-se olhares. Os ociosos, cansados de nada terem feito, bamboleiam, fingindo degustar insolentemente a música. Tudo é, aqui, rico e feliz. Tudo respira e inspira a preocupação e a alegria de viver. Tudo, menos o aspecto daquela turba que se apoia, ao longe, no balcão externo, apanhando gratuitamente, ao sabor do vento, um farrapo de música, e contemplando o coruscante ambiente interior.

É sempre interessante esse reflexo da alegria do rico no fundo dos olhos do pobre.

Mas, naquele dia, através aquele povo vestido de algodão e de chita, eu notei um ser cuja nobreza contrastava vivamente com toda a trivialidade do meio.

Era uma mulher alta, majestosa e de feições tão nobres que não me lembro de ter visto alguma que se assemelhasse nas coleções das belezas aristocráticas do passado. Um aroma de altaneira virtude emanava de toda a sua pessoa. O rosto, triste e abatido, correspondia exatamente ao grande luto de que se revestia. 

Também ela, como a plebe a que se misturara e que ela não via, contemplava o mundo luminoso com um olhar profundo, e escutava, meneando de leve a cabeça.
Visão singular! Certamente, pensei, a pobreza, se pobreza existe, não deve admitir a economia sórdida; é o que me diz aquela nobre fisionomia. Porque, então, permanece ela, voluntariamente, num meio em que aparece como um foco luminoso? Aproximando-me dela com curiosidade, julgo ter descoberto o motivo. 

A viúva segurava pela mão uma criança igualmente vestida de preto. Por módico que fosse o preço da entrada, seria talvez o bastante para pagar uma das necessidades do pequenino ser, ou melhor ainda, o supérfluo, um brinquedo.

Assim tornará ela a entrar, a pé, meditando e sonhando, só, sempre só. Porque o filho é turbulento, egoísta, sem doçura e impaciente: não pode, como um simples animal, o cão ou o gato, servir de confidente às dores solitárias.

Charles Baudelaire, "Pequenos poemas em prosa"

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