Em dado momento perguntei se com toda a experiência adquirida e conhecimento do mercado abriria uma livraria novamente, sem pestanejar respondeu prontamente “uma livraria geral com certeza NÃO”. E completou o raciocínio, “hoje não há mais lugar para uma livraria geral com início heroico, virou briga de cachorro grande, ou começa com muito dinheiro, o que pouca gente tem, e provavelmente quem tem não vai investir numa livraria, ou abre uma livraria segmentada muito boa em acervo e serviços”.
O que ele disse na ocasião a cada dia é mais presente na realidade do mercado editorial. Comentamos também que a Livraria da Vila tenha pegado justamente essa transição, começou o caminho para ser tornar rede quando ainda era possível e já na época com um investimento considerável.
Acredito que esse caminho agora seja sem volta. Criar uma livraria independente hoje passa obrigatoriamente pela segmentação, além de primar pela competência de atendimento.
Óbvio que alguns discordarão de mim, pois há livrarias tradicionais gerais sobrevivendo, mas o que vejo é cada vez mais são notícias de alguma delas dando o último suspiro. Aos poucos e conforme as demandas vão surgindo essas livrarias segmentadas vão se instalando (ou se adaptando), direito, arte, judaicas, comics e por aí vai...
A explicação é muito simples. As redes, pela necessidade de ter “de tudo” (o que em termos reais é impraticável), acabam tendo somente os títulos top de cada segmento ou autor; empiricamente acredito que isso represente somente 20% dos títulos ativos. Já uma livraria segmentada estimo que possa ter 80% das obras disponíveis do segmento que se propõe a atender e com atendimento muito mais qualificado.
Tudo isso favorece enormemente a sobrevivência da livraria, no entanto não exime de ter vários “tentáculos” para atingir o seu público, e a internet é uma ferramenta essencial nessa nova realidade, em especial as redes sociais. Embora o presente possa parecer pouco promissor há caminhos.
De outro lado (sem antagonismos), também os editores passam por uma transformação semelhante já há alguns anos, grandes grupos de origem nacional e estrangeira tem sido responsável por compras e fusões que resultaram em empresas e catálogos potentes que em nome de mil títulos vendáveis empurram quatro mil goela abaixo de muitas livrarias.
Essa concentração diminui sensivelmente a capacidade de negociação do mercado de uma forma geral. A ocupação dos espaços dos pontos de venda inibe -- e em muitos casos quase míngua -- a possibilidade das pequenas editoras colocarem seus produtos nos pontos de venda.
O caso das editoras ainda tem um agravante: como sua produção é pequena em número de títulos e exemplares, todo o processo proporcionalmente é mais caro que de uma grande editora, os salários pesam mais, não conseguem bons preços na compra de papel, custo de logística são proporcionalmente maiores e tem menor fôlego financeiro para suportar a inadimplência entre outros fatores.
A saída mais viável para uma sobrevivência em longo prazo é também a segmentação, trabalhar muito bem um segmento abrangendo subcategorias da área escolhida e oferecendo serviços agregados ao livro, coisas que em grande escala para um grande grupo editorial se tornam inviáveis.
Quero deixar claro que essa reflexão é para apresentar um caminho que parece o mais viável para manter a bibliodiversidade, caminho este que já está sendo trilhado por alguns editores e sendo descoberto por outros. Também os fatores mencionados que caracterizam a situação atual e me motivaram a argumentar a favor desse caminho são os mais evidentes em cada caso e estão longe de esgotar o assunto, que quanto mais debatido mais tende a evoluir se esse for o real interesse das partes interessadas.
Carlos Ferreira
Nenhum comentário:
Postar um comentário