Relembrando o que já fiz para ler – “desde ‘botar’ marido pra dormir, esperar o danado cair nos braços de Morfeu, ligar o abajur e abrir o livro... ai que ‘trepeça’ boa!.. –, não imagino um mundo sem livros de papel. E os prazeres inenarráveis de abrir, folhear e ler um livro? De marcar onde parou, fechá-lo e a fissura de retomar a leitura?” (“Ler é bater pernas pelo mundo com as endorfinas nas alturas”, O TEMPO, 1º.11.2012).
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Na semana passada, recomendei “O Futuro Roubado”, de Theo Colborn, Dianne Dumanoski e John Peterson Myers (L&PM Editores, 1997), numa crônica que escrevi pensando em minhas netas Luana e Maria Clara e nos netos Lucas e Inácio, pois já estou quase na prorrogação de minha expectativa de futuro, mas a “netaiada” tem futuro pela frente.
E registrei: “O título ‘O Futuro Roubado’ hoje é mais que um livro. É também um conceito político de resistência aplicável a conjunturas políticas que retiram, usurpam, entravam direitos e roubam a cidadania, tornando perenes as assimetrias econômicas, as exclusões e as vulnerabilidades sociais e políticas” (“‘O Futuro Roubado’ é um livro científico que dói na cidadania”, O TEMPO, 10.5.2016).
Parênteses para dizer que fiquei impactada com o artigo de Paulo Tedesco “O golpe no mundo do livro”, no qual diz que, “em tempo de golpe político, é bom repensar o mundo do livro e dos autores e sua trajetória em períodos repressivos” ; e reaviva nossa memória com alguns autores clássicos que passaram por situações complicadas diante de momentos políticos: Dostoiéwski, Antonio Gramsci, Graciliano Ramos, Federico Garcia Lorca... (Vermelho, 9.5.2016).
Clarinha, minha neta, mal deitamos, pega um livro e os meus óculos de leitura dizendo: “Vamos ler, num é, vovó?”. Agora que ela está lendo, ainda titubeante, travamos uma peleja para ver quem vai ler. Outro dia ela “me pegou de jeito”.
Nas mãos, meu livro “Então, Deixa Chover”, cuja capa ela venera – uma mulher montada num cavalo com suas duas filhas e o filho –, indagou como eu o escrevi. Conversa vai, conversa vem, pediu-me que eu contasse a história sem ler o livro!
– Mas, Clarinha...
– Escreveu, não escreveu? Como não sabe contar sem olhar no livro?
Que jeito, né? Falei, falei... “Agora, vó, lê no livro!”. Já cansada, li um trechinho... Cochilava quando, como num sonho, ela retirou cuidadosamente meus óculos, o livro de minhas mãos, verificou meus lençóis, beijou meu rosto num sorrisinho matreiro, se achegou, e dormimos abraçadinhas...
Pela manhã, ainda na cama, disse-me: “Ih, vovó, estou preocupada. Fica lendo, lendo e dorme. Pode quebrar os óculos! Toma cuidado, vó! Depois, como vai escrever no computador as histórias tão bonitas que tua cabeça inventa?”. E rimos. Ô delícia...
Eis um futuro que não podemos permitir que seja roubado!
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