Cada um com seu canteiro de poemas impublicáveis. Poemas satíricos, líricos, grotescos, herméticos, místicos, épicos, pornográficos. Poemas como uma maneira de chamar certos segredos que por direito compõem a matéria da intimidade de cada um, como um jardim no pátio interno de um claustro. Ninguém além de seu dono precisa saber a verdade que lá está plantada, camélia, jasmim, cacto, papoula, jurema, mandrágora, ou mesmo só pedregulhos num espaço todo cimentado. E se o dono não der fim ao que existe ali antes que já não possa cuidar desse jardim por conta própria, então, o que era um poema impublicável, flor de valeriana ou flor de maio, passará de mão em mão, de boca em boca, fazendo publicamente rever a vida e a reputação do seu íntimo proprietário. Muitas vezes, nem é preciso esperar tanto. São milhares de enxeridos por aí que se infiltram pelo olho da fechadura, que vasculham onde não são chamados e encontram o que não é de sua alçada. E que surpresa vergonhosa, que espantosa armadilha, quando o que encontram esses olhos curiosos não é uma coleção de armas nem um monte de taras, que estranho calafrio quando o que encontram é de fato um baú com poemas de verdade, algum retalho muito simples de infância ou alguma dor profunda, cujo dono, por cautela de mestre oriental, soube esconder dos outros a vida inteira como se a ninguém além dele pudesse um dia fazer mal. Que constrangimento se quem invade o claustro alheio encontra um canteiro luzindo de flores brancas enquanto seu próprio pátio interno se ressente de excesso de espera e nenhuma gota d’água.
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