terça-feira, setembro 1

Do batom e de outros sabores

De três em três meses, sempre num dia 1º, ela me manda um envelope. Dentro, um delicado papel sem nenhuma palavra, só com sua boca impressa em batom escarlate. Procuro sempre conter o impulso dos meus lábios, mas às vezes, faltando ainda alguns dias para a chegada do envelope, já quase não se distingue sua boca, e o papel tem um sabor triste.

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Quando ela ajeita os cabelos assim cuidadosamente, como se cada fio de ouro fosse um gatinho recém-nascido, ele imagina quantos homens e quantas mulheres já se fascinaram com esse gesto, e quantos ainda se encantarão, e sente uma tristeza absurda por todos eles, por todas elas.

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Quando, com a idade, alcançou os dons da concisão e da sabedoria, toda noite escrevia em seu diário uma só palavra: amor.

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Submeter-se ao amor é o mais venturoso triunfo que um homem pode conquistar.

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O que mais o magoou não foi a mulher, dormindo, ter dito Dorival (seu nome é Róbson), mas haver acrescentado meu amor.

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A não ser nos momentos em que o amor fala por nós, tudo que temos a dizer na vida é nada.

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Era uma dessas mulheres amorosas, capazes de afogar quatro gatinhos numa bacia, embrulhá-los como se fosse dá-los de presente e ir enterrá-los no quintal, cantando para eles e chamando-os de filhinhos.

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De todas as parcelas que compõem a vida, o amor é a única maior que ela.

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Ter um estilo significa, na maior parte das vezes, escrever mal sempre da mesma forma, obedecer a um padrão de mediocridade.

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Trazer a lua e colocá-la como flor no colo da amada não consta mais entre as provas exigidas para completar o currículo dos poetas. Já nem se pedem mais aquelas verborrágicas odes, aqueles alentados sonetos e aquelas mirradas quadrinhas.

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Entre o risonho amor e a vida, quem há de escolher a megera?

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A poesia é, de todas as insanidades, aquela que costuma ser vista com maior simpatia. Há mesmo quem a descaracterize como loucura e a catalogue como mera tolice.

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É insano dedicar-se integralmente à literatura. Um espaço, ainda que mínimo, deve ser reservado à vida.

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Digamos sempre que é o amor a nossa lembrança mais bela, ainda que precisemos mentir.

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