Com muito capricho, escrevi o meu nome na página 7, a do prefácio assinado por André Gide, e registrei: Livro número 001. Tinha certeza que, na minha vida, compraria muitos e muitos livros, uns cem. Era o meu sonho ter uma casa forrada de livros por todos os lados.
A minha, naquela época, não tinha muitos. No escritório do meu pai, ele guardava na estante, muitos compêndios técnicos sobre meteorologia, sua profissão, e algumas enciclopédias: O Tesouro da Juventude, o Mundo da Criança, a Delta Larousse e uma, com apenas dois volumes: Como Criar Meninos e Como Criar Meninas.
Um dia perguntei ao meu pai porque ele não comprava a Enciclopédia Britânica, aquela com a lombada gravada em ouro, meu sonho de consumo de menino. Ele disse que era muito cara e eu entendi perfeitamente que criar cinco filhos e ainda comprar uma Enciclopédia Britânica em 30 volumes, não dava mesmo.
Depois de me apaixonar com as aventuras do piloto Fabien do Voo Noturno, parti pro segundo livro, A Filha do Diretor do Circo, que o meu pai tinha, escondido, na sua pequena biblioteca. O livro era meio esquisito porque veio com as páginas coladas e minha mãe teve de abrir, uma a uma com a faca. Nunca mais parei de ler livros.
Jornalista formado, toda casa que ia – e ainda vou – entrevistar pessoas, adoro quando vejo uma estante cheia de livros. Outro dia mesmo fui na casa do Marcelo Dantas e fiquei encantado com a biblioteca que ele tem na cozinha, transbordando de livros de culinária: Nobu, the cookbook, Peru, uma aventura culinária, À mesa com Burle Marx, O livro essencial da cozinha vegetariana, Salted, Wok e muitas outras preciosidades.
Curioso que sou, hoje sempre fotografo com o meu smartphone as bibliotecas dos outros. Adoro ver fotos nos jornais e revistas, em que as pessoas posam na frente de uma estante. Foi assim que descobri um livro meu – O Mundo Acabou – na casa do escritor Moacyr Scliar.
Outro dia, fui ver o filme Que horas elas volta? pela segunda vez, só pra descobrir que livro era aquele que a Jessica se interessou, quando viu a estante do patrão da sua mãe, a Val. Foi prestando muita atenção que tive certeza se tratar de Viva o Povo Brasileiro, do João Ubaldo Ribeiro.
O filme Chico, um Artista Brasileiro, também já vi duas vezes, só pra bisbilhotar a biblioteca do compositor de Vai Passar. O lance é muito rápido mas deu pra ver que Chico tem na casa dele, além do volumoso Dicionário Houaiss, os dois volumes da Mitologia do Kaos, um total de 1.304 páginas que reúne a obra do compositor Jorge Mautner, aquele do Maracatu Atômico, do Samba Japonês e do Me segura que eu vou dar um troço.
Bisbilhotar bibliotecas é bom por isso. Eu nunca poderia imaginar que o filho do Sergio Buarque de Hollanda guardava em casa, escritos de Mautner, como esse:
“Minha missão é a de acordar as pessoas. Pouco a pouco vou virando cada vez mais pregador do que escritor. Na conversa confessional, tudo é diferente e propício! O momento existencial inescapável, as mudanças da face com quem se fala, a respiração, a noite ou o dia que nos envolve”.
Alberto Villas (Carta Capital - 18/12/2015)
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