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Que bonito é ver o amor outra vez assim estropiado, como sempre volta de suas batalhas quixotescas. O amor é o General Derrota. Sempre necessitado de conforto, de um caldinho na boca. Que a enfermeira não exagere, porém, nos cuidados. Ainda é cedo para soarem outra vez os clarins.
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Piores eram as horas finais da tarde, quando, dissipadas as esperanças da manhã, a noite se aproximava e, com ela, a certeza de mais um dia malogrado, o sabor acre da derrota, os calafrios da insônia – e, se por bênção vinha o sono, o pesadelo carregado de autorrecriminações.
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Tudo em nós pode arrefecer, mas o coração deve estar sempre exaltado e esperançoso, como um combatente que, perdido na selva, não saiba ainda que a batalha foi inglória e a derrota cobrirá de vergonha as próximas três gerações.
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Viver da memória não é reviver. Viver da memória é reconhecer que estamos mortos para o presente e nos alimentamos do passado, tentando fazê-lo cada vez mais valioso. Viver da memória é uma admissão de covardia, um atestado de preguiça e uma proclamação de derrota. Apresentar imagens da infância como as melhores que temos até hoje é confessar que desperdiçamos décadas de vida rezando diante do túmulo de um menino cuja memória conservamos mais com o esforço de nossa imaginação que com a precisão de nossas lembranças. Esse menino teria agora cinquenta, sessenta anos. Podemos fazer isso com um menino?
Raul Drewnick

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