terça-feira, janeiro 7

Falar de poesia

Antes de tudo, não falar. O poema tem todas as palavras necessárias para que não seja preciso dizer mais nada, partir dele.

Depois, falar devagar.

Falar da sua construção. Procurar a origem do poema por dentro do que ele nos diz.

Falar com o poema. Falar de cada palavra, de cada verso. Encontrar através deles os fios de uma lógica que não passa apenas pelo sentido ou pelo que é dito, mas sobretudo pelo que só a percepção instintiva, sensorial, pode captar, no que está para além do que é dito e se solta das próprias palavras.

Ouvir o poema para poder falar dele.

Ignorar todos os discursos sobre o poema e sobre a poesia. Esse lixo verbal só nos impede de ouvir o que o poema tem para dizer.

Depois de falar do poema, e só depois, procurar saber o que outros disseram? Pura curiosidade.

Procurar, como um suplemento de curiosidade, o que os próprios poetas disseram do poema e da poesia.

Se tivermos sabido, com essa leitura, alguma coisa para além do que o poema nos disse, desconfiemos do poema.

Um poema, quando o é, diz tudo o que há para saber sobre si.

Nuno Júdice, Relâmpago, n.º 6 ( Abril, 2000)

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