Medonho desastre. Perdido na procela, o avião precipitou-se no mar, a pouca distância da costa da Flórida. Era noite fechada quando as lanchas do serviço de salvamento da Marinha norte-americana chegaram ao local do sinistro. E ali sob a chuva, na negra noite, começaram a pescar os cadáveres de passageiros e tripulantes. O primeiro a aparecer foi o da Princesa Hindu, que sorria com uma estrela-do-mar aninhada entre os seios. O gordo Homem de Negócios boiava abandonado, como um fofo boneco de borracha, e em sua boca aberta mexia-se um caranguejo. Vieram outros. O Moço de Bordo com uma medusa na testa... A Americana Loura com os cabelos soltos e os olhos vidrados... O Comandante todo condecorado de anêmonas... Tinham os braços enredados em algas, e a morte lhes pintara nos rostos as cores mais doidas. Por fim ficaram faltando apenas os corpos dos brasileiros. Holofotes aflitos varejavam as águas. Longe cintilavam as luzes de Miami. A chuva caía, o mar gemia, o vento dizia - nunca mais, nunca mais, nunca mais... E assim uivando foi-se continente adentro, rumo do outro oceano e das luminosas terras da Califórnia, para onde havia poucas horas fugira também o pensamento e o desejo de muitos dos passageiros daquele trágico avião. Nunca mais...
Vi quando pescaram meu próprio cadáver. Meu rosto estava esverdinhado à luz dos holofotes. Como um estranho peixe fui içado para bordo e atirado para o fundo da lancha, como uma coisa sem dono nem serventia. No fundo da minha memória antepassados fatalistas murmuraram: "Morreu? Acabou-se".
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