sexta-feira, abril 22

Sebo solidário

Existem dois momentos importantes na vida de um leitor: aquele em que ele se apaixona pela literatura e sai comprando livros compulsivamente e outro, quando a biblioteca está abarrotada e é preciso selecionar o que fica e o que será repassado. Na minha adolescência, vivi a primeira fase. Felicidade era passar a tarde na Travessa, na Saraiva ou no Sebo Baratos da Ribeiro (na época, em Copacabana). Os livros tinham (e ainda têm) algo de sagrado para mim; eu cheirava suas páginas, sentia seu peso e textura antes de mergulhar na história — evitando abrir muito as folhas para não marcar a lombada, claro. Foi nesse período de imersão nos livros que conheci o Sebo Solidário Celpi — Costura e Lactário Pró-Infância. Se você for como eu, acho que vai gostar de conhecer também.

O Celpi é uma obra social criada em 1925 com o objetivo de produzir enxovais de bebê para gestantes carentes que chegavam aos hospitais cariocas sem uma peça de roupa sequer para seus bebês. De lá pra cá, o trabalho se ampliou. Os enxovais continuam sendo produzidos por equipes de voluntárias que se encontram semanalmente, mas a obra abraçou outros desafios como atender famílias carentes da IV Região Administrativa, com concentração na comunidade de Santa Marta (Botafogo), com cestas básicas, agasalhos no inverno, material escolar no início do ano para as crianças matriculadas na rede pública, presentes na Páscoa, Dia das Crianças e Natal; e também disponibilizar muitos serviços em sua sede: reforço escolar, atendimento jurídico, psicanalítico e psicopedagógico, aulas de informática, xadrez, artes, dança, teatro e yoga.

Onde nós, apaixonados por livros, entramos nessa história? Explico: Mariana Albuquerque, professora no Departamento de Economia da PUC, era vinculada ao Celpi e, certo dia, chegou à segunda fase que mencionei lá no início: precisava desmanchar uma estante do seu pai e se desfazer de alguns livros ótimos de economia e política. Resolveu, então, fazer uma venda beneficente e acabou se tornando livreira solidária.

Sebão entre pilotis da PUC-Rio
Como funciona? Simples! Mariana preparou uma lista com os livros disponíveis e circulou por e-mail entre seus colegas de departamento. Todos os livros foram vendidos. Aos poucos, foram chegando mais livros, as listas foram crescendo e alcançaram cada vez mais pessoas: uma comunidade de leitores solidários começou a ser criada. Atualmente, todos os livros à venda são doados, e o trabalho dos livreiros é voluntário. Com isso, a receita gerada é revertida integralmente para ajudar aos que mais precisam. Assim, o Sebo Solidário Celpi cumpre uma dupla missão: além de angariar fundos e ajudar a manter os projetos da Celpi, democratiza a leitura oferecendo livros de qualidade por bons preços.

Além de vender na Celpi e pela internet, eles participam de bazares beneficentes e eventos. Neste ano, pela terceira vez, passaram uma semana nos pilotis da PUC, tendo vendido mais de 3.500 livros. Na sede da Celpi, há ainda um banco de livros didáticos de todas as séries do ensino fundamental e médio que são distribuídos gratuitamente para qualquer pessoa que quiser ir lá buscar. Às quartas-feiras é dia de bazar solidário, e sempre há uma mesa de promoção com livros por R$ 2.

Vale muito a pena. Acabei entrando na lista de e-mails do Sebo Solidário Celpi por acaso. Tem de tudo, entre clássicos, literatura brasileira contemporânea, estrangeira, didáticos e não ficção. Enquanto estava naquela primeira fase, comprei centenas livros com eles, muitos de Agatha Christie, Arthur Conan Doyle e Stephen King. Hoje, são mais de cinco mil livros cadastrados com preços a partir de R$ 5. O pessoal é confiável e envia livros pelo correio para todo o Brasil, atingindo até pessoas que reclamam que não há sebos em suas cidades.

Interessados em receber as listas devem mandar um e-mail para eles em sebosolidario@gmail.com. Indiquem aos amigos apaixonados por livros para que entrem nesse grupo. E se você, assim como eu, está naquela fase de se desfazer de alguns livros porque a biblioteca está abarrotada, doar para o Sebo Solidário é sempre uma ótima opção também.
Raphael Montes

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