Ando com saudades das cigarras, das sandálias, de deixar o ventilador ligado o dia inteiro. Há muito não tínhamos um inverno tão rigoroso e ele parece encolher tudo, dos músculos às vontades. Um amigo diz que “o frio civiliza”, mas o preço a pagar é alto para quem tem alma tropical. Acordo e durmo tensa, sofro com a água fria da pia, reduzo as idas à rua, fugindo do vento gelado. Outro efeito colateral: à noite, sob a montanha de cobertas, penso nos que estão lá fora sem qualquer proteção a não ser fogueiras improvisadas, álcool goela abaixo, folhas de jornal, papelões. E fico mal, a consciência doendo mais que cãibra.
Para relaxar, busco na memória lembranças amenas. Ainda menina, a família de uma coleguinha nos levou a passar uns dias em Ribeirão Pires, nas férias de julho. Andando pela cidade, usávamos short e me lembro até hoje do frio. Bom mesmo era quando brincávamos dentro de casa. A tia mais nova permitia que usássemos suas roupas, bijuterias e sapatos de salto, e nos tornávamos princesas de um reino só nosso, onde a friagem não nos atingia.
Também me recordo de noites da adolescência, onde nos divertíamos com o hálito branco que escapava de nossas bocas. Como os preceitos ecológicos eram inexistentes, desfilávamos com nossos gorros de pelo animal e, nas colunas sociais, as mulheres abastadas exibiam estolas de pele. As feitas com o sacrifício de raposas costumavam incluir o corpo inteiro do pobre animal, da cauda à cabeça, de um gosto desde então duvidoso.
Agosto me fez tirar velhos agasalhos do baú e agilizar o estoque de meias. Também estreei o edredom de pelo de carneiro que garante o sono. Às refeições, sempre que posso, substituo o suco de laranja pelo vinho. Mas confesso que conto os dias para a chegada do verão. Antes de ser civilizada, sou praiana de nascença e preciso do calor do sol para ser feliz.

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