segunda-feira, agosto 18

Milton Hatoum agora é imortal – e dai?

O Milton Hatoum, manauara da gema, vai levar para aquela casa de fardões verdes, um pedaço da Amazônia que não se encontra nos guias turísticos. Ele escreve de um jeito que a gente quase sente o cheiro do tucupi e ouve o barulho do barco no porto. É o tipo de literatura que faz a pessoa viajar sem precisar comprar passagem — e sem sofrer com fila no check-in.

Sabe aquele amigo que nunca perde a piada, mesmo no meio de um assunto sério? Pois é, a eleição do Milton Hatoum para a Academia Brasileira de Letras é dessas notícias que dão pano pra manga numa mesa de bar.

“Imortal”, disse o Ratinho, o nosso garçom, pousando a cerveja. “Quer dizer que o homem não morre mais?” É aquele mesmo Milton do Tucunaré, Clube de Campo? Aquele que jogava bola “CUNNÓS”? eu lembro que ele era muito bom de tênis de mesa. Tinha até mesa na casa dele. Ele e o tio jogavam e cortavam como poucos. Depois da bola sempre tinha um bom banho de igarapé nas águas vermelhas do Mindú. Eita banho bom! Aquela água limpa e gelada só Jesus para trazê-la de volta.


A gente explicou, ainda comemorando, que não é bem assim. Imortal, no caso, significa que o nome dele vai ficar para sempre na lista da ABL, junto com Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade e Jorge Amado. A alma sobrevive nos livros, mas o corpo… bem, continua pagando conta de água, luz e telefone como todo mundo. Agora, o Milton, toda vez que entrar na ABL, nós estaremos entrando com ele e tomando conta da cadeira do Machado.

No meio da prosa, alguém perguntou: “Mas o que se faz lá na Academia? É tipo um clube?”

Mais ou menos. É um clube, sim, mas onde o que se troca não é figurinha de Copa, e sim histórias, ideias e votos para escolher novos imortais. Um lugar onde a fofoca é literária e o café provavelmente vem com citações.

Com livros como Dois Irmãos e Cinzas do Norte, o Milton Hatoum já era imortal para quem lê de verdade. Agora, tem a cadeira oficial, com placa e tudo. E convenhamos: se cadeira fosse critério de imortalidade, bar também faria seus campeões — tem freguês que passa tanto tempo sentado que já devia ter número fixo.

No fim das contas, a eleição dele é mais do que apenas uma boa notícia: é um acontecimento que merece ser celebrado com tacacá e bolinhos de piracuí. A Academia Brasileira de Letras, com sua história centenária e suas cadeiras cobiçadas, ganha agora uma dose generosa de literatura amazônica, recheada de memórias de rios largos, cheiros de mata e vozes que ecoam desde a beira do igarapé até os centros urbanos. O Amazonas, por sua vez, vê-se representado num dos endereços mais tradicionais e simbólicos do país, algo que, por si só, já é motivo de orgulho para qualquer conterrâneo.

Nós, que acompanhamos à distância, como espectadores de uma peça cuidadosamente ensaiada, também ganhamos um motivo para brindar — e não apenas com um gole de café ou um copo de vinho de buriti, mas com a satisfação de saber que a cultura regional encontrou ainda mais espaço no cenário nacional.

Estamos certos de uma coisa: quando o Milton, com seu traje de Imortal — resistente tanto à kriptonita verde quanto ao curare dos velhos contos amazônicos — erguer a voz, poderá reivindicar para as novas gerações, em um gesto concreto: a recuperação do seu querido Grupo Escolar Barão do Rio Branco e do nosso Colégio Estadual do Amazonas, hoje quase caindo, na Avenida 7 de Setembro, a principal Avenida de Manaus. Essas duas casas são muito mais que prédios: são símbolos de memória, de Ensino e aprendizado. Celebrar esse Imortal é também plantar sementes para que surjam outros.

“Então vamos fazer um brinde ao Imortal!”, gritou o Ratinho garçom, já servindo mais uma.

E lá fomos nós, levantando os copos, porque se a eternidade existe, talvez ela comece assim: numa boa história contada entre goles do legítimo guaraná de Maués, buriti, açaí, tacacá e muitas risadas.

O Milton é um pai d´égua!

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