Agora toda a gente quer saber tudo e, se não lhes dizem o que querem saber, desconfiam a redobrar.
As confissões, por muito chorosas, já não convencem ninguém. Os pedidos de desculpa muito menos — então quando cheiram a dedos de advogado… Querem mais. Mais lágrimas.
Já ninguém acredita que houve um tempo em que isto de querer sempre saber tudo era visto como uma obsessão mesquinha, uma curiosidade insana, um caminho certo para a infelicidade.
Lembro-me do meu pai a ler, e a levantar os olhos do livro para registar a realidade da minha interrupção. Num olho meio-amarelo, meio-castanho, estava a consciência do dever de um pai para com um filho. No outro, meio-castanho, meio verde-azeitona, estava a revolta: “Deixa cá ver o que este quer…”
Mal eu me tinha lançado a fazer a minha confissão, aproveitando a frescura do ensaio que um minuto antes tinha feito à frente do espelho da casa de banho, ele dizia estas três palavras, enquanto a cabeça baixava outra vez para o livro: “Prefiro não saber.”
Se eu protestasse, ele apaziguava-me: “Deixa estar, Miguel, eu também já fui novo. Tenho a certeza que aquilo que tens para me dizer é muito importante, mas acredita que assim é melhor para todos, está bem?” E depois lá vinham as três palavras, já com um pingo de nitroglicerina: “Prefiro não saber.”
Hoje dou-lhe razão. Guardemos a nossa curiosidade para as coisas que, uma vez sabidas, nos trazem riso e excitação. Guardemos a nossa curiosidade para as coisas e para as pessoas que se deixam descobrir, sem resistência ou esperteza, ou estratégia, ou manipulação.
Numa vida, só temos tempo para saber tão poucas coisas, porque é que havemos de arranjar espaço para os pormenores que nunca mais acabam, das confissões que outros nos fazem?
Dizem-nos que é por termos direito a saber, mas é mais pelo direito que eles acham que têm, de desabafar. Eles ficam aliviados. Nós ficamos pressionados a reagir. Quem é que ficou a perder? Quem é que ficou a ganhar?
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