Os livros antigos pagam liberalmente a quem os atura. Não há velhice mais dadivosa e agradecida do que a deles. Sentam-se conosco á sombra de árvores, suas coevas, e contam-nos coisas que viram os plantadores das árvores. Nos silêncios das noites giadas dos nossos janeiros, eles, eu os contam aos centos, aconchegam-se de nós e conversam com o mesmo afeto das tardes estivas, embora o frio lhes esteja orvalhando os pergaminhos da capas. Ótimos amigos que nem quando nos adormecem se agastam, e até sofrem ser ouvidos sem ser escutados!
Referem eles, à volta de passagens deleitosas, casos mortificativos. De hortos enverdecidos e jardins recendentes, a súbitas, vos transferem aos Gros das grandas e ladeiras fragosas em que sentis o dissabor do desencantamento. Que faz isso? Mandai-os calar; folheai, voltai olhos para as amenidades d’onde saístes ou ide em cata d’outras; que eles, os sofridos velhinhos, vos não hão de, por despeitados, sonegar ao inventário, todo vosso, as contas de outro de sempre altíssimo quilate misturadas com outras despreciadas e desluzidas pelo atrito dos séculos.
Dos amigos vivos, mais lidos, sabedores e inventivos, quantos tendes que vos enchessem oito dias de palestra alternada de ridente comédia e penetrativa tristeza de catástrofes?
Mas não ides mais de vontade para o escrutar de grandíssimos infortúnios, que vos fazem e mostram de cinzas esquecidas uns vultos viventes e apaixonados?
O que ai vai por crônicas de frades, por livros menos lidos do que as crônicas, bons para história, ótimos para filosofia, e melhor de tudo, balsâmicos e vivificantes para corações despegados do “hoje em dia” e do nubeloso “amanhã” que a ciência, a cada hora vai inoitando mais, apagando-lhe esplendores que já n’um tempo entreluziram à espiritualidade do santo ou à candideza do poeta!”Camilio Castelo Branco, prefácio de “Cavar em Ruínas”, editado em 1867
Dos amigos vivos, mais lidos, sabedores e inventivos, quantos tendes que vos enchessem oito dias de palestra alternada de ridente comédia e penetrativa tristeza de catástrofes?
Mas não ides mais de vontade para o escrutar de grandíssimos infortúnios, que vos fazem e mostram de cinzas esquecidas uns vultos viventes e apaixonados?
O que ai vai por crônicas de frades, por livros menos lidos do que as crônicas, bons para história, ótimos para filosofia, e melhor de tudo, balsâmicos e vivificantes para corações despegados do “hoje em dia” e do nubeloso “amanhã” que a ciência, a cada hora vai inoitando mais, apagando-lhe esplendores que já n’um tempo entreluziram à espiritualidade do santo ou à candideza do poeta!”Camilio Castelo Branco, prefácio de “Cavar em Ruínas”, editado em 1867
Nenhum comentário:
Postar um comentário