quinta-feira, maio 28

Passo Fundo - o cancelamento é uma tragédia

O anúncio do cancelamento da Jornada de Literatura de Passo Fundo, que deveria acontecer este ano, é um fato muito grave, tanto pelo que significa de prejuízo para um projeto vitorioso, como pelas implicações que decorrem dos mecanismos de financiamento da cultura em nosso país.

A Jornada de Passo Fundo é (esperamos que o uso do presente continue válido) um empreendimento de uma universidade particular. A Universidade de Passo Fundo não faz parte nem do sistema estadual nem do sistema federal de universidades públicas. Reconheço que não tenho detalhes sobre o conjunto de suas atividades, nem sobre a avaliação geral de seus cursos.



A Jornada, por sua vez, é uma iniciativa da Tânia Rösing – que acho que já está até aposentada – que a criou há quase três décadas. Muito modesta no início, foi arrebanhando admiradores e apoiadores entre alguns dos principais escritores do país, que colaboram e colaboraram para a organização do evento. Cito, de memória, alguns que já prestaram sua contribuição ao evento, como o Ignácio de Loyola Brandão, o Josué Guimarães e o Deonísio da Silva.

A principal característica da Jornada de Passo Fundo, que a torna única, é que não se trata simplesmente de um evento. Os dias da jornada propriamente dita são precedidos e sucedidos por um trabalho sistemático junto ao conjunto das escolas de ensino fundamental da região, com a leitura dos romances, contos e novelas dos autores convidados (e mesmo dos que não são). O resultado disso, pelo que já tomei conhecimento, é um efetivo aumento da qualidade dos resultados das avaliações pedagógicas na região. Não apenas no domínio do português, como também de outras áreas. Afinal, quem sabe ler e escrever corretamente com certeza tem condições de mostrar desempenho melhor nas várias áreas do conhecimento.

As notícias sobre o cancelamento da Jornada não deram conta da suspensão ou da continuidade desse trabalho junto à rede escolar. Se o cancelamento se refletir também nessa área, seu prejuízo será incomensurável para os jovens da campanha gaúcha.


A professora Tânia Rösing, sua idealizadora e até hoje dirigente, possui inúmeras virtudes que, em determinados momentos, podem até parecer defeitos. A principal é o seu compromisso com a qualidade do evento. Nisso, Tânia Rösing não transige. Conseguiu transformar um problema – o da falta na cidade de um local suficientemente grande para o acontecimento – em uma solução altamente criativa e simpática: as Jornadas acontecem debaixo de lonas de circo. Mas Tânia Rösing não abre mão da ampla seleção de convidados. Importante: os convidados não são apenas os autores. São as crianças e professores de muitos municípios em torno de Passo Fundo, que devem ir de ônibus, ter um mínimo de garantia de alimentação e segurança para participar na Jornada.

O cancelamento da Jornada deste ano, ao que tudo indica, está acompanhado também do cancelamento do que seria o 9º. Prêmio Zaffari Bourbon de Literatura. O Prêmio era (ou ainda é, oxalá) um dos mais significativos da vida literária nacional. Patrocinado pela rede de supermercados Zaffari, que faz parte do grupo Bourbon de hotéis e shoppings centres, se for cancelado também significará uma perda importante.

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