quinta-feira, dezembro 8

Nuvem

Dia lindo desse, a vida de luzes acesas, combinadas, certinhas, eis que surge a nuvem. É uma bela nuvem, de volumes cheios, que mudam de forma o tempo todo. O sol traça os contornos de dourado, mas você nem repara a princípio em como é linda. Mas deixa-se atrair, à medida que ela chega, devagar, e vai mudando as cores, você repara nessas coisas.

Um dia de calmaria.
A nuvem encobre aos poucos o sol, muda o tom da vida, uma luz diversa. Aos poucos, aos flocos, ela vai possuindo o dia e o que era azul vai ganhando branco. Tem uns cinzas no meio, mas você só vê os brancos.

O sol fica encoberto, o calor arrefece, escurece. Não chega a ficar frio, mas algo em você treme. De vez em quando, o sol fura a nuvem em raios que parecem trazer um recado: não fui embora, não se esqueça, estou sempre aqui.

A nuvem envolve você, na velocidade de um espanto. Parece uma neblina espessa, divina, que sobe do chão e ganha o alto. Cerca o mundo, até que você não vê mais nada, está cercado pela nuvem, cegado pela nuvem, parece um tipo de gás mas é nuvem.

Mas ela não pediu para vir, não teve culpa de acontecer. Só apareceu, você que quis saber mais, menino curioso de cabelos brancos. Ao contrário: se dependesse da nuvem, ela iria para outro lado, envolver outros mundos, nunca que quis encobrir esse.

Você tenta conhecê-la melhor, ela se dissipa. Quer tocar, entender, ter a nuvem, ela muda de formato, some e reaparece ali, some e nem reaparece. Nas voltas atrás dela, você fica tonto e quer se sentar, mas não há chão.

Então, a chuva. Por três dias e três noites e três meses e três anos, só faz chover. Você não consegue enxergar, cercado pela neblina, e vai se ensopando, afundando na poça, se queimando e pior: os morros, suas pedras, sua referência, estão encobertos, desapareceram, bem como as lanternas e os salva-vidas de costume.

E vem o vento. Bate forte no corpo, gruda a roupa na pele; um tapa no rosto, uma folha seca entra nos seus olhos, você esfrega com os dedos e – hã? – acorda, foi salvo pelo vento, que soprou a nuvem mais linda que já houve, feito ventilador que afasta um calor que arrepia mais que esquenta. A nuvem vai como veio. Fica uma coceira estranha nos olhos.

E o sol volta, ou o mais lindo de tudo: sempre esteve. Ele brilha, seca a pele, sem pressa, como a mãe fazia com a toalha em você menino, e enxuga toda tristeza. Seu olhar é paciente, como se perguntasse: sério que você achou que uma nuvem fosse colorir melhor?

Você segue a sombra que o sol acendeu, ela tenta imitar seus movimentos, você dá um pulo e cai pisando pesado sob a sombra. Acabou.

Nuvem. Sei. Ela não venceu. Não dessa vez.

Cássio Zanatta

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