“Não existe nada mais parecido com um homem do que um livro.
Com um homem ou com uma mulher. Porque os livros têm sexo. Encontrei livros
masculinos, livros femininos, livros neutros. Bem ou mal encadernados, entes e
livros carregam destino igual. Só que as nossas traças e os nossos cupins
exageram a rapidez. Há livros felizes. Há livros infelizes. Todo livro é um
milagre. Mesmo o livro que não presta. Começou dando prazer a quem o realizou,
prazer de ilusão, o melhor; e a quem o lê, dá a ventura de se julgar superior,
ventura que não é séria, mas é tão agradável! O livro é o milhão dos pobres. É
a certeza dos impossíveis desesperados. É o Pedro Álvares Cabral das terras
desconhecidas, descobertas por acaso. É o mundo debaixo dos nossos olhos. Pelo
livro podemos viajar em torno de um quarto e ir até aos planetas suspeitos de
rivalidade. Vemos obras-primas de museus e exposições, sentados em casa. Vamos à guerra
de pijama. Assistimos em
Nova Iorque e em Tóquio, a comédias dolorosas, a dramas
engraçados, a óperas adormecentes. Olhamos bailados. Ouvimos canções. Pelo
livro entramos nos circos universais e os palhaços fazem cabriolas, saltam,
gritam coisas diante de nós, que nunca tínhamos rido tanto... Abençoados os que
fazem livros! São eles que inventam a vida. São eles que mudam os figurinos da
vida”.
Texto "Abençoados", no livro "O dia nos Olhos", de Álvaro Maria da Soledade Pinto da Fonseca Velhinho Rodrigues Moreira da Silva (1888/1964), conhecido por Álvaro Moreyra, escritor, poeta e teatrólogo
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