Este livro surgiu durante o primeiro e mais literariamente brilhante período da carreira de H. G. Wells (1866-1946), quando ele produziu uma impressionante série de romances misturando informação científica, especulação filosófica e conhecimento jornalístico, além de um domínio seguro da narrativa de ação e aventura. Em pouco mais de uma década ele publicou A máquina do tempo (1895),A ilha do dr. Moreau (1896), O homem invisível (1897), A guerra dos mundos (1898), entre outros, além de dezenas de contos extraordinários.
Igor Morski |
Wells é um desses escritores de talento que têm a sorte de enriquecer muito cedo com seus escritos e usar esse sucesso para tentar mudar o mundo. Viajou muito, discutiu com luminares e estadistas de toda parte. Publicou dezenas de ensaios de história, sociologia especulativa, futurologia. Na história da ficção científica talvez somente Arthur C. Clarke tenha exercido um ativismo em escala internacional como o seu (Isaac Asimov ou Ray Bradbury também poderiam tê-lo feito, se viajassem de avião). Quanto às suas previsões futuristas, são mais ambiciosas do que as de Jules Verne, até porque foram publicadas sob forma de ensaios para uma futurologia.
Em suas obras filosóficas e de especulação histórica, Wells tentou imaginar para o futuro uma civilização mais humanista do que a nossa, no sentido de ver cada ser humano não apenas como um animal provido de força de trabalho ou um número numa estatística. Um modo de viver onde se reconheça que o trabalho e o consumo são termos de uma equação mais complexa, e não a fórmula essencial da vida.
Mas Wells não é um cientista que escreve, é um jornalista científico. Um jornalista da pena rápida e verbo fluente, mas com base na ciência. Não falo de conhecimentos científicos profundos; para um escritor como ele bastava ter um correto entendimento do que é o método científico, do grau de honestidade factual e da boa informação técnica necessários para construir as hipóteses especulativas que a ficção científica requer.
Os marcianos de Wells são o primeiro retrato do alienígena como encarnação do Outro, do Estranho, de tudo que representa o nosso medo diante do desconhecido, e principalmente de um desconhecido que nos provoca repulsa. Neste sentido, A guerra dos mundos trouxe aos leitores da época uma vigorosa e verossímil descrição literária de um Monstro Legião, um monstro que, ao contrário do monstro de Frankenstein, não é uma criatura isolada fabricada no sótão de um cientista imprudente. É uma espécie inteira, rival da nossa, disputando conosco um território que até então tínhamos imaginado ser exclusivamente nosso.
Braulio Tavares
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