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Um poeta, mesmo o mais velho deles, sempre pode, por uma dessas inesperadas florações do amor, estar andando por um parque, pegar o bloco para anotar um verso e com esse gesto provocar um alvoroço de borboletas amarelas.
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Perguntam-me o que deve ter um soneto. Simples. Dois quartetos e dois tercetos ou, na forma shakespeariana, três quartetos e um dístico final. Só? Basicamente isso. E principalmente a extraordinária coragem de se mostrar e a resignação cristã de suportar vaias, deboches e até ameaças. Um soneto é o lirismo pendurado num poste e malhado num sábado, como Judas.
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Se tirassem de sua lista o amor, o poeta não teria outro caminho senão reforçar sua aliança com as estrelas, as flores e os passarinhos.
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O amor é um velhaco que nos esvazia o bolso e nos enche o saco.
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Tudo bem, você se gaba de nunca ter se ajoelhado diante do Amor. Eu me orgulho da dor que sinto ainda hoje nos joelhos, toda vez que os apalpo.
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Diante do Amor devemos curvar-nos. Sabemos já que ele não é o que imaginávamos, mas, se nos descartarmos também dessa ilusão, a maior, viveremos de quê e para quê?
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Aviso na porta: “Se não vens me falar do amor (bem ou mal), melhor é nem entrares.”
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Como eu gostaria de voltar a ser aquele idiota caminhando certa manhã pela Paulista, sorrindo para o sol e sendo retribuído.
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Um bom exercício poético é soprar as nuvens cor-de-rosa para além do horizonte, preparando a tarde para que a noite estenda sobre ela seu tapete e se deite com seu vestido estrelado.
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Toda mulher hábil no manejo de um chicote há de ter os lábios adequados para soprar feridas.
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Você não precisa do atestado de louco para ingressar na literatura. Em pouco tempo ela lhe providenciará um, lavrado pela mesma esmerada letra em que qualquer grafólogo reconhecerá traços iguais aos encontrados nos manuscritos de Satanás.
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Ao poeta cabe manifestar-se sobre o que é de sua alçada: a lua, as flores, o amor. Talvez algo mais, talvez mais nada.Raul Drewnick
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