Quando o Maurinho Branco assaltou minha casa e não roubou muito, mas roubou tudo, esquecemos de lhe perguntar qual era o seu signo. Se ele fosse de Touro, ia começar um diálogo assim: “Ô meu irmão, desculpe, também sou Touro”. E daí acabávamos descobrindo que temos um mesmo ascendente (astrológico, claro), ele tomava um cafezinho e se despedia como um cavalheiro. Iria assaltar alguém de Áries.
Aí é que desanimei de vez. O meu futebol era muito mais lido do que assistido. Em 1958 eu morava em Bruxelas e vi o delírio que o Brasil despertava. Pelé e Garrincha eram a dupla de mais cartaz no mundo. Nem os Beatles, que eram quatro e tiveram o cuidado de aparecer depois, lhes chegavam aos pés. No polo Norte, em 1965, vendo o sol da meia-noite, um esquimó me pulou no pescoço na maior alegria e agitação.
Só depois vim a saber a razão. Porque eu era brasileiro. “Pelé! Pelé!” — gritava ele, eufórico. O esquimó fedia um pouco a peixe, mas tudo bem. Dava gosto ser brasileiro. O futebol unia todo mundo num só grito. Rico e pobre, branco e negro, analfabeto e intelectual. Até o Kissinger gostava. Agora, escreve o Villas-Bôas Corrêa: “Para mim, chega”. Despediu-se do futebol. Um alucinado que não perdia jogo. Com o Brasil ruim de bola como anda, precisamos providenciar uma alma nova para este paisão perdido no meio do campo.
Otto Lara Resende, "Bom dia para nascer"
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