Calma, calma, também tudo não é assim escuridão e morte. Calma. Não é assim? Uma vez um menininho foi colher crisântemos perto da fonte, numa manhã de sol. Crisântemos? É, esses polpudos amarelos. Perto da fonte havia um rio escuro, dentro do rio havia um bicho medonho. Aí o menininho viu um crisântemo partido, falou ai, o pobrezinho está se quebrando todo, ai caiu dentro da fonte, ai vai andando pro rio, ai ai ai caiu no rio, eu vou rezar, ele vem até a margem, aí eu pego ele. Acontece que o bicho medonho estava espiando e pensou oi, o menininho vai pegar o crisântemo, oi que bom vai cair dentro da fonte, oi ainda não caiu, oi vem andando pela margem do rio, oi que bom bom vou matar a minha fome, oi é agora, eu vou rezar e o menininho vem pra minha boca. Oi veio. Mastigo, mastigo.
Mas pensa, se você é o bicho medonho, você só tem que esperar menininhos nas margens do teu rio e devorá-los, se você é o crisântemo polpudo e amarelo, você só pode esperar ser colhido, se você é o menininho, você tem que ir sempre à procura do crisântemo e correr o risco. De ser devorado. Oi ai. Não há salvação. Calma, vai chupando o teu pirulito. Eu queria ser filho de um tubo. No dia dos pais eu comprava uma fita vermelha, dava um laço no tubo e diria: meu tubo, você é bom porque você não me incomoda, você é bom porque é apenas um tubo e eu posso olhar para você bem descansado, eu posso urinar a minha urina cristalina dentro de ti e repetir como um possesso: meu tubo, meu querido tubo, eu posso até te enfiar lá dentro que você não vai dizer nada. As doces, primaveris, encantadoras manhãs do campo. As ervinhas, as graminhas, os carrapichos, o sol doirado, e os humanos cagando e mijando sobre as ervinhas, as graminhas, os carrapichos e sob o sol doirado. Meu filho, não seja assim, fale um pouco comigo, eu quero tanto que você fale comigo, você vê, meu filho, eu preciso escrever, eu só sei escrever as coisas de dentro, e essas coisas de dentro são complicadíssimas mas são… são as coisas de dentro. E aí vem o cornudo e diz: como é que é, meu velho, anda logo, não começa a fantasiar, não começa a escrever o de dentro das planícies que isso não interessa nada, você agora vai ficar riquinho e obedecer, não invente problemas. Empurro a boca pra dentro da boca, chupo o pirulito e choramingo: capitão, por favor me deixa usar a murça de arminho com a capa carmesim, me deixa usar a manteleta roxa com alamares, me deixa, me deixa, me deixa escrever com dignidade. O quê? Ficou louco outra vez? E o teu filho não tá com encefalite? Toma, toma quinhentos cruzeiros novos e se não tá com inspiração vai por mim, pega essa tua folha luminosa e escreve aí no meio da folha aquela palavra às avessas. Uc? Não seja idiota, essa é a primeira possibilidade, invente novas possibilidades em torno do. Amanhã eu pego o primeiro capítulo, tá? Engulo o pirulito. Ele me olha e diz: você engoliu o pirulito. Eu digo: não faz mal, capitão, o uc é uma saída pra tudo. Está bem. Ele sai peidando no meu belíssimo pátio de pedras perfeitas e grita: amanhã, hein? Sorrio.
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