segunda-feira, julho 29

Uma porção de nadas

Embora hoje possa não parecer, nasci para escrever.

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Na vida de um escritor, não há como escapar. Só há dois modos de ser: ou viver para contar, ou contar para viver.

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Honro minha espécie, sou dócil por inteiro. Que não possa quem me matar chamar-me de mau cordeiro.

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Aos oitenta, para o poeta mais vale um bom prato de polenta e um pote de geleia que os dez cantos de uma epopeia.

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Escrever tem sido igual, desde a primeira vez, tantas décadas atrás. O que vem mudando é a esperança, cada dia mais mirrada.

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No terreno baldio, a placa: é proibido jogar gatos.

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Mulheres não mais. Para o velho agora só prescrevem vitaminas e sais minerais.

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Quem fala com seus botões dá pano para mangas.

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Para os preguiçosos e para os que têm calos nos pés, um passo já é meio caminho andado.

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Como diz um velho político, a moderação é tão alta virtude que mesmo a honestidade, quando praticada, deve levá-la em conta.

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Se um dia me baixar o santo, que seja um de primeira: ou o Padre Eterno ou o Padre Vieira.

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Conte a um poeta romântico seus sucessos amorosos, mas jamais as desilusões, a menos que você deseje matá-lo de inveja.

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Venho descobrindo que minha maior contribuição para a literatura pode ser escrever cada vez menos ou definitivamente mais nada.

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As mulheres inalcançáveis são as que inspiram as melhores escadas, os mais eficazes venenos e os suicídios mais justificáveis.

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Hoje, se pensa no sexo e em suas engenhosas práticas, seu sorriso é o mesmo que abre ao se lembrar de bolo de fubá que a avó fazia quando ele era menino.

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Gostaria de ser um mártir que, morrendo pelo amor, pudesse repetir o calvário quantas vezes quisesse.

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Sente-se como alguém que subitamente, num velório, descobre que está deitado porque é o morto.
Raul Drewnick

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