Alfredo Martirena(Cuba) |
Ano, 2120. Local, Green Town (citado em outras obras suas). Os oráculos se reuniram num templo conhecido como Nova Delfos – por ter, no alto, uma sentença de Tales de Mileto, “A certeza é precursora da ruína”. E chegaram à conclusão de que jamais houve um vírus tão contagiante, e tão mortal, como aquele. Ainda mais forte que o disseminado, pelo planeta, nos anos de 2019/2020. Provavelmente, mutação do “covid” (sarscov2) com o “ebola” (corobola). Para se diferenciar da anterior, acordaram que seria chamada "Cruel Pandemia". Para preservar vidas, os oráculos decidiram que no segundo S, do minuto M, e na hora H, do dia D, todos deveriam permanecer em suas PODs (unidades habitacionais mínimas). Até quando alguma vacina fosse descoberta. Naquela Nova Democracia, que agora vigorava, todos os homens eram verdadeiramente iguais.
Ocorre que começaram a surgir problemas não previstos, pelos sábios. Antes de irem para suas moradias, os funcionários das companhias de água e energia tiveram a cautela de desligar as matrizes de força. E deixaram de funcionar elevadores, geladeiras, BI2 (Brain Internet Interface), que substituíram TVs e computadores. Até os "housebots" (robôs domésticos) pararam. No campo, a produção de grãos foi interrompida. Fecharam transportes, supermercados e deliverys. Alimentos começaram a apodrecer. E faltar. Água também. Como os policiais estavam se preservando, longe, PODs eram invadidas. E seus ocupantes, mortos. Famintos vagavam, sem destino, pelas ruas. Cadáveres se amontoavam, nas esquinas, sem ter quem os sepultasse. Quílon, mais velho dos oráculos, antes de morrer de sede, anotou em sua caderneta que o modelo adotado, para proteger os habitantes, era só um belo discurso. E que a Nova Democracia fracassou.
P.S. Claro que a história da Arca é falsa. Mas devemos refletir, com mais calma, sobre essa história. Porque a tese de mandar a classe média se trancar nos apartamentos só funciona se o Brasil real estiver nas ruas, se expondo e assumindo riscos, na luta para sobreviver.
José Paulo Cavalcanti Filho
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