O filme de Kubrick é de 1968. O conto de Clarke foi escrito em 1948 e publicado pela primeira vez em 1951, com o título “Sentinela da eternidade”. Curiosamente, o próprio escritor ficava irritado sempre que referiam a ligação entre o conto e o filme, afirmando que um tinha tanto a ver com o outro quanto uma bolota com o carvalho resultante dela. É uma boa imagem. Longe de contradizer, apenas confirma a justeza da genealogia. O filme incorpora ideias de vários outros contos de Clarke. Porém, o conceito seminal está lá — o de um misterioso artefato alienígena abandonado na lua, para vigiar o processo de desenvolvimento da Humanidade. Clarke, que escreveu o roteiro de “2001 — Uma odisseia no Espaço” em conjunto com Kubrick, publicou depois quatro romances com esse título, desenvolvendo o enredo apresentado no filme.
Como qualquer admirador da obra de Kubrick, tenho seguido com curiosidade (e um sorriso divertido) a saga do misterioso monólito que apareceu no Utah, numa área desértica e de acesso difícil, para desaparecer alguns dias mais tarde. Um outro monólito, entretanto descoberto numa colina sobranceira à cidade de Piatra Neamt, na Romênia, também já desapareceu. Mais recentemente surgiu um terceiro no topo de uma montanha, próximo de Atascadero, pequena cidade californiana.
Quando esta crônica for publicada é possível que já tenham sido encontrados outros tantos monólitos — um termo incorreto, aliás, pois os objetos em causa são de aço e não de pedra.
Podemos tirar duas ou três conclusões rápidas desta súbita monolitomania: a primeira é que as pessoas estão ansiosas de que alguém, ou alguma coisa, as resgate da armadilha temporal — confusa, interminável e perigosa — em que nos encontramos aprisionados. Já poucos acreditam que a Humanidade possa salvar a Humanidade. Venham então os extraterrestres e os seus aparelhos indutores de inteligência!
Sou cético. Acho mais provável que uma baleia demonstre interesse em salvar a Humanidade, não obstante a forma como as temos tratado, do que um qualquer ser alienígena. Pelo menos temos em comum com os cetáceos certa história evolutiva, além do amor pela música e pelos mares. Infelizmente, contudo, não há muitas pessoas dispostas a promover o diálogo com as baleias, e menos ainda com as orquídeas.
Esforçando-me por manter certo otimismo estrutural prefiro pensar nesta proliferação de monólitos como uma homenagem ao cinema e, em particular, a um filme que consegue, como poucos, resumir a longa caminhada da Humanidade e a nossa irreparável solidão.
Ou talvez eu esteja procurando respostas complexas para um fenômeno que não expressa senão o ululante vazio do presente: a loucura tornou-se, afinal, a nova normalidade.
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