Tristes eram as fogueiras das festas de São João que um tio fazia: um fogo murcho, acanhado, produto de quatro lenhas desanimadas, que nem fumaça para arder os olhos soltavam. Como triste era sua desculpa: “fogo grande não, vai que bate um vento e leva fagulha ao canavial”.
Triste é sentir frio num país cinza e triste. De doer é ser adolescente e não receber correspondência. Ter de se levantar da cama ainda escuro. É não ouvir de ninguém “Feliz Natal” na noite de Natal. É quando chega o dia, depois de tantos anos, em que sua tia mais querida não te reconhece mais.
É perder a hora ao ver o rádio-relógio piscando a hora em que a luz faltou de madrugada. Um botão faltando na camisa preferida. A morte do seu cachorro, tristeza que se repete – com sorte – de 15 em 15 anos. Estudar onde pendurar o quadro e fazer um furo na parede da sala para em seguida se arrepender. Triste é um bar fechado. É o fim do Carnaval, nem que você nem ligue mais para Carnaval.
Pheona Kerr |
Tristíssimo é o pôr do sol do dia em que o Brasil é eliminado da Copa.
É alguém ficar rico e nada mais, apenas rico. É a lágrima de uma dor não física. É repetir de ano e ouvir as velhas piadas dos mesmos professores. São os passageiros olhando para o nada, disfarçando, buscando ignorar o pedinte no ônibus. É sair do banho e se dar conta de que deixou a toalha secando na área de serviço. Tristes são as folhas de rúcula, couve e alface jogadas na calçada no fim da feira.
É alguém perguntar “como vai fulana?”, sem saber que ela partiu (claro que fulana ter ido embora é mais triste, mas ter de explicar o motivo também é). Mais triste ainda é você mentir, dizendo que todos vão bem, obrigado.
Tristes são 78% das fotos nas carteiras de identidade. A bocada no doce que aciona a dor da cárie. São todos os domingos de noite, mesmo que você não tenha que trabalhar no dia seguinte. É uma passeata de cinco pessoas. Um 0 a 0 num estádio vazio. Triste é a risada de quem não entendeu a piada. O recado que você anotou com tanta pressa que não consegue ler o recado. São os palhaços sem nenhuma vocação. A pele marcada por uma tatuagem que não tem nada a ver com a pessoa.
Tem coisa mais triste que lojinha de rodoviária? Olhar-se no espelho e constatar que o corte de cabelo ficou ridículo? O silêncio no jantar do último dia de férias? Talvez só mesmo procurar, e não encontrar, uma foto sequer dos irmãos juntos.
Agora, triste, triste mesmo, é o fim do amor. O amor é a coisa mais triste quando se desfaz – e eu sou doido de contradizer Vinicius de Moraes?
Cássio Zanatta
Nenhum comentário:
Postar um comentário