Louise Catherine Breslau (1856-1927) |
Nas comemorações dos 200 anos da morte da escritora inglesa Jane Austen (1775-1817), no último dia 18, teve de tudo: desde o lançamento de uma nota de dez libras com sua imagem na Inglaterra até um chá em sua homenagem na Confeitaria Colombo, no Rio, com direito a atores com roupas de época. Juntando-se a isso as inúmeras reedições, traduções, adaptações e continuações dos seis romances que Austen escreveu, fica provado que ela é a autora clássica mais popular da atualidade, com um fã-clube que rivaliza em tamanho e devoção apenas com o de seu conterrâneo William Shakespeare. Mas é justamente essa popularidade e a profusão de produtos com o nome de Jane Austen estampado que fazem com que alguns desconfiem da qualidade da obra da autora, muitas vezes considerada uma escritora menor de temas superficiais. Afinal de contas, por que ler Jane Austen?
Em primeiro lugar, porque Jane Austen está entre os melhores autores da história da literatura mundial, incluindo-se aí homens e mulheres. Seus livros têm uma prosa enxuta, de precisão cirúrgica, enredos complexos e harmônicos como os passos de dança da Era Georgiana, e personagens delineados com absoluta perfeição. Os vilões, os heróis e, sobretudo, as heroínas de Austen nunca são caricatos, mas de um realismo brilhante que nos envolve e nos faz amá-los, odiá-los, rir deles e torcer por eles. É isso que faz da obra de Austen tão atual: suas páginas mostram a natureza humana com a verdade incontornável de um espelho.
Em segundo lugar, porque Jane Austen é hilária. O humor é a principal característica de suas obras, o que pode ser facilmente comprovado por qualquer um que se familiarize com seus escritos de juventude, publicados por diversas editoras no Brasil. Nesses textos curtos, que Austen escreveu apenas para sua família e amigos mais próximos, ela ri da nobreza, da Igreja, da família e do casamento com uma falta de pudor espantosa para a jovem filha de um pastor anglicano que morava no interior. Esse riso implacável continua presente nos romances — embora sob um véu de ironia fina que o esconde de olhos menos atentos, o que permitiu a Austen ser publicada numa época em que o conservadorismo tomava conta de seu país, e continuar a ser admirada pelos tacanhos cegos de hoje.
E, finalmente, porque Jane Austen é importante. É verdade que os grandes acontecimentos de seu tempo mal são mencionados em seus livros, onde as guerras napoleônicas, por exemplo, são pouco mais que pano de fundo para bailes e piqueniques. Mas isso acontece porque Austen escolheu retratar a vida de quem travava suas batalhas nas salas de estar: as mulheres. Num tempo em que estas tinham pouquíssimas opções profissionais, em que o divórcio era quase inexistente e em que as esposas eram, por lei, completamente dependentes dos maridos, escolher o homem certo na hora de se casar era uma questão de sobrevivência. É dessa sobrevivência que Austen trata em seus romances, onde, apesar dos finais felizes, ela sempre nos lembra das consequências nefastas das escolhas erradas, vistas nos casais infelizes, nas mulheres arruinadas por um passo errado, na pobreza das viúvas. Austen jamais nos permite esquecer a fragilidade da condição das mulheres do seu tempo, o que mostra que, como todos os grandes escritores, ela trata da humanidade não só com verdade e coragem, mas também compaixão. E sempre com um sorriso nos lábios.
Julia Romeu
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