Era uma biografia de são Francisco, a qual ele examinou furtivamente, sentindo que ao fazê-lo cometia um pequeno roubo.
Juntava as sílabas, e à medida que o fazia, o desejo de compreender tudo o que havia naquelas páginas o levou a repetir a meia voz as palavras capturadas.
O padre despertou e observou, divertido, Antonio José Bolívar com o nariz metido no livro.
— É interessante? — perguntou.
— Desculpe, eminência. Mas eu o vi dormindo, e não quis incomodá-lo.
— Interessa-lhe? — repetiu o padre.
— Parece que fala muito de animais — respondeu timidamente.
— São Francisco amava os animais. Amava todas as criaturas de Deus.
— Eu também gosto deles. À minha maneira. O senhor conhece são Francisco?
— Não. Deus me privou de tal prazer. São Francisco morreu há muitíssimos anos. Quer dizer, deixou a vida terrena e agora vive eternamente junto ao criador.
— Porque li o livro. É um dos meus preferidos.
O padre enfatizava suas palavras acariciando a rafada brochura. Antonio José Bolívar o olhava enlevado, sentindo a coceira da inveja.
— O senhor leu muitos livros?
— Uma porção. Antes, quando ainda era jovem e meus olhos não se cansavam, devorava toda obra que parasse em minhas mãos.
— Todos os livros tratam de santos?
— Não. No mundo há milhões e milhões de livros. Em todas as línguas, e abrangem todos os temas, inclusive alguns que deveriam estar proibidos aos homens.
Antonio José Bolívar não entendeu aquela censura e continuou com os olhos cravados nas mãos do padre, mãos gorduchas, brancas sobre a brochura escura.
— De que falam os outros livros?
— Já lhe disse. De todos os temas. Há livros de aventuras, de ciência, histórias de seres virtuosos, de técnica, de amor…
O último interessou-lhe. Conhecia do amor aquilo que ouvia nas canções, especialmente nos pasillos cantados por Jurito Jaramillo, cuja voz de guaiaquilenho pobre às vezes escapava de um rádio de pilhas tornando os homens taciturnos. Segundo os pasillos, o amor era como uma picada de um inseto invisível, mas procurado por todos.
— Como são os livros de amor?
— Temo que não possa lhe falar disso. Não li mais que um par.
— Não importa. Como são?
— Bem, contam a história de duas pessoas que se conhecem, se amam e lutam para vencer as dificuldades que os impede de ser felizes.
Luís Sepúlveda, "Um velho que lia romances de amor"
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