Por sua linguagem provocadora e sua engenhosidade, numa literatura ainda da segunda metade do século XIX, reler cada um daqueles contos é tarefa obrigatória de quem se atira naquelas páginas, ou melhor, naquele calhamaço de páginas em papel offwhite ainda pela primeira vez. Aliás, nem é necessário ser neófito, mesmo um leitor já experimentado naquelas histórias vê, de forma pouco usual, a necessidade em se voltar à primeira linha de qualquer dos contos para melhor compreender os enigmas e os desvãos das tramas e histórias.
Como, então, hoje, no avançar do novo milênio propagar a leitura literária e qualificada diante do volume de outras leituras e possibilidades? Sim, como falei, não há fórmulas, não tem como. Mas se temos tempo e disposição como determinantes, portanto, reduzindo, por exemplo, a carga horária de trabalho, que no Brasil é um absurdo de 44 horas – e com a “pejotização” do trabalhador tende a piorar, afinal estarão asfixiadas as horas extras e os descansos remunerados –, seria por si um dado a ser levado em conta quando se fala em aumento qualificado da leitura.
Ler implica, necessariamente, na compreensão do que se leu, e quem leu e não souber verbalizar ou reescrever curtamente o que acabou de ler, demonstra que ainda há um bom caminho a percorrer, e nessa hora a humildade e o tempo são nossos melhores amigos, pois é preciso reler para encontrar ali o que antes não se viu.
Também não se quer dizer que se deva ler aquilo do qual não se gosta, mas assim como na comida e na bebida, um esforço de experimentação nunca é demais. E um esforço como esse pede o quê? Tempo e disposição, novamente.
Precisamos, portanto, de uma reforma trabalhista, de uma reforma no ensino e no país, mas uma reforma que diminua as horas de trabalho, que amplie o ensino para mais e mais áreas e que abra tempo para o aluno poder exercer livremente a leitura e o tempo da releitura; e uma reforma nacional para que deixemos de ser tão atrasados e compreendamos que, a seguir o rumo da política nacional, breve voltaremos ao Brasil da chegada de Dom João VI – menos de duas décadas antes do nascimento do gigante Fiódor Dostoiévski em sua Rússia semifeudal, onde uma pequena elite tinha acesso aos livros e mandava seus filhos para estudar na Europa, enquanto a massa de brasileiros permanecia na mais profunda das ignorâncias e no pior dos analfabetismos.
Paulo Tedesco
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