quinta-feira, abril 12

De chatos e outros tipos

Um chato ativa em nós o mais agudo sentimento de legítima defesa.

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O chato é um daqueles tipos que estão sempre no seu dia de inspiração máxima.

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Os chatos vivem ameaçando o mundo com autobiografias.

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Um chato nunca tem poder de síntese.

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A primeira tentativa de estilo de um escritor consiste quase sempre em pendurar em cada substantivo pelo menos um adjetivo. É a fase dos enfeites. Os textos ficam parecendo árvores natalinas.

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Há cem anos a suprema rebeldia era começar frases com pronomes oblíquos.

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Um sonetista dificilmente fica impune.

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De vez em quando, os velhos escritores fazem algo pela literatura: morrem e abrem espaço para os jovens, que infelizmente envelhecerão também.

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Os sonetos – com exceção talvez de um por cento – são uma prova de que a pior poesia só se consegue com excepcional esforço.

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É sempre com orgulho que me proclamo triste. Vejo nisso, não posso negar, minha única superioridade.

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Não se mate buscando a perfeição. Tudo que você quer alguém já fez – ou fará – muito melhor.

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O bom humor em mim é ocasional, uma espécie de falha de caráter. Por formação e convicção, sou um triste.

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O lobo vai à casa do cordeiro. Quer participar de uma fábula e precisa de um parceiro.

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A vingança dos suicidas: olham-nos de cima e mostram-nos a língua.

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Quando sinto pena de mim, ponho-me no colo e me nino, como se eu fosse um gato doente.

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Minha desgraça foi conhecer-me a mim mesmo antes de poder ser alguém melhor.

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Receio morrer antes de ter proclamado a grandeza da minha pequenez.

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Era um defunto incômodo, desrespeitoso. Seu gogó estava mais pontudo e obsceno do que nunca.

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A um defunto não basta parecer sério.

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Os poemas concretos sofrem a fadiga dos materiais.

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Tenho alma de órfão, de cachorro abandonado. Sonho com lareiras, seios fartos, tigelas transbordantes de comida.

[Raul Drewnick

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