As portas das casas vazias pendem abertas; vêm e vão ao sabor do vento. Bandos de meninos vêm das cidades para lhes quebrar as vidraças das janelas e procurar tesouros ocultos nas ruínas. Aqui está uma faca de lâmina partida. É uma boa coisa. E... olhe, está cheirando a rato morto aqui. Vejam o que o Whitey escreveu na parede. A mesma coisa ele escreveu no banheiro da escola e o professor fez ele limpar tudo.
Na noite que se seguiu à partida daquela gente, os gatos que estiveram caçando nos campos regressaram e ficaram miando às portas. E como ninguém atendesse, os gatos entraram nas casas vazias e percorreram miando os quartos vazios. Depois, voltaram aos campos e desde então transformaram-se em gatos selvagens e caçavam quatis e ratazanas e dormiam de dia nas cavidades do solo. Quando a noite chegava, os morcegos, que se haviam ocultado nos vãos das paredes com medo da luz do dia, batiam suas asas longas nos quartos vazios e algum tempo mais tarde tornavam a ocultar-se nos cantos escuros e ali ficavam durante o dia todo, asas fechadas, pendendo de cabeça para baixo entre o vigamento, e o cheiro de sua urina enchia as casas desabitadas.
Os ratos entravam e acumulavam provisões nos cantos, nas caixas, nas gavetas e nas cozinhas. E as doninhas entravam e caçavam os ratos, corujas pardas esvoaçavam gritando e tão depressa entravam como saíam.
Veio então um forte aguaceiro. O joio brotou diante dos degraus das portas, onde jamais brotara, e a grama crescia entre as varandas e as portas. As casas estavam abandonadas, e casas abandonadas ruem rapidamente. Rachas formavam-se pelos revestimentos de madeira, a partir de buracos de pregos enferrujados. Grossas camadas de poeira assentavam nos pavimentos e a sua lisura era apenas perturbada pelas pegadas dos ratos, doninhas e gatos.
Certa noite, o vento arrancou uma telha e lançou-a no chão. O próximo golpe de vento penetrou na abertura deixada pela telha, e tirou mais três, e depois mais doze. O sol do meio-dia brilhou e lançou uma mancha dourada no pavimento através do grande buraco do teto. Os gatos selvagens regressavam à noite dos campos, mas não mais miavam nos degraus. Moviam-se qual sombras de nuvens ao luar, e se esgueiravam para os quartos. E nas noites de ventania as portas batiam com estrondo nos umbrais, e cortinados rotos flutuavam agitados de encontro às vidraças partidas.
John Steinbeck, "As vinhas da ira"
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