Ele ergueu os olhos, cegando-se com o sol refletido nas roupas brancas e rendadas dela. —De modo algum, muito me agrada a cidade. —Deve ter estado aqui várias vezes; e já não vê novidades. —Esta é a primeira. —E nenhum brilho nos olhos? Nenhum sorriso de admiração? —Estava rezando—mentiu. —Ah, desculpe por ter incomodado—ela disse, voltando a fitar a terra, sempre mais próxima. As pessoas ao redor faziam comentários sobre a cidade, tão bonita vista assim do mar, numa manhã de sol. Alguém identificava torres de igreja, um morro, o Paço Imperial, revelando a euforia própria de quem chega à Corte depois de ter deixado para trás a província e sonha viver grandes acontecimentos.
Francisco João de Azevedo também desejava experimentar o prazer, mas este não estaria na paisagem, nas vidraças da rua do Ouvidor, nem nos restaurantes ou no teatro. As coisas mundanas não o fascinavam nem um pouco. Em verdade, suas mãos não o seguravam ao navio, seguravam-no a si mesmo. Vestindo casaca preta, calças folgadas e botinas bem polidas, dava a impressão de um homem refinado. Só as mãos destoavam. Não serviam para o sinal da cruz, para se colocarem juntas, simbolizando contrição, e muito menos para ministrar santos sacramentos. Quando apertava a mão de outros religiosos, até causavam constrangimentos. O tecido adiposo das mãos dos padres, macias como estofados, contrastava com a aspereza da sua, e os religiosos se afastavam num susto quando elas se encontravam, como se tivessem tocado em um inseto asqueroso
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