sexta-feira, agosto 28

'Livro(s) do Desassossego' como Pessoa sempre quis

A Global Editora está lançando este mês o livro de Fernando Pessoa respeitando a individualidade de cada um dos semi-heterônimos: Vicente Gudes, Barão de Teive e Bernardo Soares. Vale explicar que a expressão "semi-heterônimo" é do próprio Pessoa, que considerava como heterônimos apenas três: Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis. Ainda assim, são vozes muito próprias, que partem de biografias inventadas como personagens de teatro. Não estarem misturados ou até preteridos como em publicações passadas é a grande novidade dessa edição, preparada por uma das mais respeitadas especialistas na obra de Fernando Pessoa, Teresa Rita Lopes. 
 
Assim como o autor foi vários, o livro também é. A primeira parte é O livro de Vicente Guedes. Os textos nessa época ainda são muito influenciados pela corrente literária simbolista. A segunda parte, O livro do Barão de Teive, já assume um tom mais seco, de um personagem que definiu por si o fim da própria vida. A terceira parte, O livro de Bernardo Soares, é notoriamente parte do que conhecemos como Modernismo. Todos têm introduções que iluminam suas leituras, escritas por Teresa Rita Lopes, em linguagem descomplicada, ainda que contendo profundo conhecimento de causa.
Ler essa obra é como espiar as décadas de dedicação aos textos, tanto da parte de Fernando Pessoa quanto dos pesquisadores de seu espólio. Teresa Rita Lopes conta que frequentemente a caligrafia do poeta é indecifrável. Somente a convivência com as leituras por anos e anos de seus poemas, muitos deles escritos à mão, ou mesmo datilografados e corrigidos à mão, é que torna possível a publicação.
Fernando Pessoa morreu cedo, em 1935, aos 47 anos. Astrólogo, ele teria previsto a data de sua morte. E organizou o que pôde, em maços de textos e indicações, o  Livro do Desassossego. Começou a escrevê-lo jovem, mas documentos demonstram que desde cedo já se tratava de um projeto. A organizadora desta novíssima edição de um clássico da Literatura mundial, Teresa Rita Lopes, implode um argumento comum sobre a obra, de que ela pode ser editada de forma aleatória: "Se Pessoa tivesse publicado o Livro do Desassossego tinha-o estruturado como o fez, o foi prevendo ao longo da vida". Como exemplo, ela ainda lembra que Mensagem, único livro de Pessoa publicado em vida, teve sua organização intensamente trabalhada pelo autor. 

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