sexta-feira, maio 4

Hoje...Hoje

Num canto quieto da cidade, lá longe, onde eu nasci, há uma ponte, uns salgueiros, um riacho. As vezes, ao anoitecer, tornando do bairro longínquo da minha casa, um bairro que se chamava lindamente: Tristeza, - eu parava ali, e os meus olhos aprendiam de cor a doce melancolia daquelas pedras, daquelas árvores, daquelas águas. E a ponte, os salgueiros, o riacho escutaram as minhas palavras que sonhavam, à hora dos sinos, quando cada um de nós é um pouco de Deus em sombra errante...

Foi há muito tempo isso... Ontem a recordar, vi ainda o meu vulto pequeno, escutei ainda as minhas frases tontas... Subia no céu a lua de Salambô... A praia pusera o seu colar de lâmpadas. As ondas do mar estavam contentes. Elas sabem que são ouvidas, de noite. Que diziam as ondas?: - Hoje... hoje... - Para as ondas não há passado, para as ondas não há futuro: - Hoje... hoje...  
Alvaro Moreyra, "As amargas, não..."

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