Fila de mendigos cegos (kuttar), em Cabul (1879) |
Isso é muito poético, ela diz. Eu estou surpresa.
Pense nela como uma loja de departamentos, ele diz. No fundo são apenas mercadorias de luxo. Assim fica menos poético.
Os tapetes eram tecidos por escravos, que eram invariavelmente crianças, porque só dedos de crianças eram suficientemente pequenos para um trabalho tão delicado. Mas o trabalho incessante exigido dessas crianças fazia com que elas ficassem cegas por volta dos oito ou nove anos, e a cegueira delas era a medida pela qual os negociantes de tapetes avaliavam e exaltavam a sua mercadoria: Este tapete cegou dez crianças, eles diziam. Este aqui cegou quinze, este outro vinte. Uma vez que o preço subia na mesma proporção, eles sempre exageravam. Era costume o comprador duvidar do que eles diziam. Com certeza não mais que sete, que doze, que dezesseis, eles diziam, examinando o tapete com os dedos. É áspero como um pano de chão. Não passa de um cobertor de mendigo. Foi feito por um gnarr.
Uma vez cegas, as crianças eram vendidas para donos de bordéis, tanto as meninas quanto os meninos. Os serviços das crianças que tinham ficado cegas desse jeito valiam uma fortuna; o toque delas era tão suave e preciso, diziam, que sob seus dedos você podia sentir as flores se abrindo e a água jorrando da sua própria pele.
Elas também eram muito hábeis em abrir fechaduras. Aquelas que conseguiam escapar abraçavam a profissão de cortar gargantas no escuro e eram muito procuradas como assassinos de aluguel. Sua audição era apurada; elas conseguiam andar sem fazer nenhum ruído, e passar através de aberturas mínimas; diferenciavam pelo cheiro uma pessoa que dormia profundamente de outra que sonhava agitadamente. Matavam tão suavemente como se fosse uma mariposa roçando pelo seu pescoço. Eram consideradas impiedosas. Eram muito temidas.
As histórias que as crianças murmuravam umas para as outras - enquanto teciam seus tapetes sem fim - eram sobre essa possível forma de vida futura. Havia um ditado entre elas de que apenas os cegos são livres.
Margaret Atwood
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