Estou sentada no sofá de veludo roxo, na sala de estar da mulher do governador; sempre foi a sala de estar da mulher do governador, embora nem sempre seja a mesma mulher, já que os governadores mudam de acordo com a política. Minhas mãos estão cruzadas no colo da maneira apropriada, embora eu não esteja de luvas. As luvas que eu gostaria de ter seriam macias e brancas, ajustadas com perfeição, sem nenhuma prega.
Venho frequentemente a esta sala, tirar os utensílios do chá, limpar as mesinhas e o longo espelho com a moldura de cachos de uvas e folhas e o piano, bem como o relógio alto que veio da Europa, com o sol dourado e a lua prateada, que entram e saem segundo a hora do dia e a semana do mês. O relógio é do que eu mais gosto na sala de estar, embora ele meça o tempo e eu já tenha tempo mais do que suficiente nas mãos.
Nunca antes, porém, eu me sentei no sofá, já que é destinado às visitas. A sra. Parkinson, mulher do conselheiro municipal, disse que uma senhora nunca deve se sentar em uma cadeira que um cavalheiro acabou de vagar, embora ela não tenha dito por quê; mas Mary Whitney disse: porque, sua boba, ainda está quente da bunda dele; o que foi algo muito grosseiro de se dizer. Assim, não consigo ficar sentada aqui sem pensar nos traseiros das senhoras que já se sentaram neste mesmo sofá, todos delicados e brancos, como trêmulos ovos malcozidos.
As visitas usam vestidos de passeio com carreiras de botões de cima a baixo e anáguas com armação de arame por baixo. É de admirar que consigam se sentar e, quando caminham, nada toca suas pernas sob as saias infladas, exceto as combinações e meias. São como cisnes, deslizando sobre pés invisíveis, ou como as águas-vivas junto às pedras do porto perto de nossa casa, quando eu era pequena, antes de empreender a longa e desafortunada viagem através do oceano. Crespas, na forma de sino, ondulando graciosamente no mar; mas, se encalhavam na praia e secavam ao sol, nada restava delas. E assim são essas senhoras: feitas principalmente de água.
Não existiam anáguas com armação de arame quando fui trazida aqui pela primeira vez. À época, eram de crinolina, já que as de arame ainda não tinham sido inventadas. Eu as vejo penduradas nos guarda-roupas, quando vou esvaziar e limpar os urinóis. Parecem gaiolas; mas o que elas prendem? Pernas, as pernas das senhoras da sociedade; pernas confinadas, para que não possam sair e roçar na calça dos cavalheiros. A mulher do governador nunca menciona a palavra pernas, embora os jornais tenham citado pernas quando escreveram sobre Nancy, com as pernas mortas projetando-se debaixo da tina.
Não são apenas as senhoras parecidas com águas-vivas que vêm à casa do governador. Às terças-feiras, temos a Questão Feminina, a emancipação disso ou daquilo, com pessoas reformistas de ambos os sexos; às quintas-feiras, o Círculo Espírita, para chá e conversas com os mortos, o que é um consolo para a mulher do governador por causa do seu falecido bebê. Mas a presença é principalmente de senhoras. Ficam sentadas, bebericando chá nas xícaras finas, e a mulher do governador faz soar seu pequeno sino de porcelana. Ela não gosta de ser a mulher do governador, preferia que ele fosse governador de alguma outra coisa. O governador tinha amigos influentes para fazer dele o governador do presídio, mas nada além disso.
Ali está ela, portanto, e deve tirar o melhor proveito possível de sua posição social e realizações e, embora eu seja um objeto de temor – como uma aranha –, assim como de caridade, sou também uma de suas realizações. Entro na sala, faço uma reverência e circulo pelo aposento, boca fechada, cabeça baixa. Recolho as xícaras ou as arrumo na mesa, depende, e elas me fitam disfarçadamente, por baixo de seus chapéus. A razão para quererem me ver é que sou uma célebre assassina. Ou pelo menos foi o que escreveram. Quando li isso pela primeira vez, fiquei surpresa, porque costumam dizer Cantor Célebre, Poeta Célebre, Espiritualista Célebre e Atriz Célebre, mas o que existe de célebre em assassinato? De qualquer modo, Assassina é uma palavra forte para estar associada à sua pessoa. Tem um odor característico, essa palavra, almiscarado e sufocante, como flores mortas em um vaso. Às vezes, à noite, eu a sussurro para mim mesma: Assassina. Assassina. Ela produz um som farfalhante, como uma saia de tafetá pelo assoalho.
Assassino é meramente brutal. É como um martelo ou um pedaço de metal. Eu prefiro ser uma assassina a ser um assassino, se essas forem as únicas escolhas.
Às vezes, quando estou espanando o espelho com as luvas, olho minha imagem nele, embora eu saiba que isto é vaidade. À luz da tarde na sala de estar, minha pele tem um tom arroxeado, como uma contusão esmaecida, e meus dentes ficam esverdeados. Penso em tudo o que foi escrito a meu respeito – que sou um demônio desumano, uma vítima inocente de um canalha, forçada contra a minha vontade e com a própria vida em risco, que eu era ignorante demais para saber como agir e que me enforcar seria um crime judiciário, que eu gosto de animais, que sou muito bonita, com uma pele radiante, que tenho olhos azuis, que tenho olhos verdes, que meus cabelos são ruivos e também que são castanhos, que sou alta e também de estatura mediana, que me visto com propriedade e decência, que para isso roubei uma mulher morta, que sou ligeira e esperta em meu trabalho, que tenho má índole e um temperamento genioso, que tenho a aparência de uma pessoa acima da minha humilde condição social, que sou uma pessoa dócil, de natureza afável, de quem nunca ninguém se queixou, que sou astuta e insidiosa, que sou fraca da cabeça, quase uma retardada. E eu me pergunto: como posso ser todas essas coisas distintas ao mesmo tempo?
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