Mestre Aurélio não registra a palavra em seu excelente Pequeno Dicionário; apenas refere catabolismo no sentido de desassimilação; aliás Aurélio também não acolhe catacavaco ou catacavaco, palavra corriqueira para designar uma interessante posição do corpo.
São cochilos do mestre. Mas qualquer pessoa gorda que quer emagrecer (caso meu e também do Aurélio, que já o vi a derreter untos numa sauna em Itatiaia, embora ele também ainda não haja acolhido a palavra sauna), qualquer pessoa como nós, que faz regime ou pelo menos lê livro que ensina a fazer regime, sabe que se diz catabólico o alimento que consome mais calorias para ser digerido do que as que fornece ao organismo: alface, abacaxi, etc. Enfim: comida que emagrece, embora alimente.
Um médico meu amigo aconselha para o verão não apenas mantimentos mas também literatura catabólica. Evitar grandes versos de Schmidt ou odes de Vinicius, consumir poemas magros de João Cabral ou Carlos Drummond de Andrade. Tirar da parede quadros de Di Cavalcanti, reproduções de Rubens ou Renoir: engordam horrorosamente. Não ouvir bossa-nova: tem muito açúcar, é melhor traçar saladas de cool jazz em estado natural.
Cuidado com as mulheres. As meigas e rechonchudinhas devem ser eliminadas; use-as magras e amargas, mas não em excesso para não suscitar úlcera no estômago. O melhor é o tipo da magra esquiva, com sabor de carne de peixe.
O ideal mesmo, aliás, é não sair muito com mulheres. Compre uma bicicleta e saia com a mesma, eis um fino conselho.
Esculturas de Bruno Giorgi são mais recomendáveis que as de Alfredo Ceschiatti. Pintor francês atual, o mais catabólico é mesmo Buffet. Ouvir acordeão engorda tanto como romance de José de Alencar e Jorge Amado; leiam Machado de Assis e Graciliano Ramos, os catabólicos da prosa brasileira.
Crônica, se gostar, que seja do gênero meio aflito, como José Carlos Oliveira; Pongetti, Braga e Elsie Lessa engordam um pouco; cuidado com os salgadinhos e frituras do Stanislaw Ponte Preta!
Entrevista de candidato sempre contém farináceos...
O melhor é não ler nada. Não ler, não amar, não comer; morrer, dormir, sonhar talvez, quem sabe...
Rubem Braga, "A traição das elegantes"
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