Eles brotam de buracos na parede. Como aquele que, da noite para a dia, surgiu numa ruazinha do Flamengo. Dentro, uma confusão, uma babel imersa em poeira. Mas quem se arriscasse a penetrar na caverna saía de lá com um livro ou um disco que nunca esperaria encontrar. Relíquia há tempos buscada e, por incrível que pareça, em bom estado. O preço, tão prodigioso quanto a descoberta: mais barato que uma mariola.
São os sebos, comércio de livros que resiste ao tempo e transformações do mercado editorial e estão em cartaz numa excelente série de reportagens da Folha. O do Messias chega a ser, pela pujança, uma contradição no país que perdeu quase 7 milhões de leitores desde 2019 e no qual a maioria da população não se dedica à leitura. O maior sebo de São Paulo, há 55 anos na praça, vende mil obras usadas por dia e tem um estoque estimado em 3 milhões de produtos.
Resistência (ou sonho?) é a palavra que move esses comerciantes. O Belle Époque, única loja do gênero num raio de quilômetros na zona norte do Rio, pegou fogo em 2022, mas conseguiu reabrir. Dupla exceção numa atividade que se concentra no centro histórico e nos últimos anos sofreu baixas pesadas. Em 2021, período mais letal da pandemia, morreu a Livraria São José, sebo-modelo da cidade que, em sua fase espetacular, as décadas de 1950 e 60, tinha três endereços e estoque de 100 mil livros.
Ao redor da praça Tiradentes havia um mundo de papéis velhos. Cada loja com sua especialidade: clássicos em francês e espanhol, edições em capa dura de obras completas (Dostoiévski, Dumas, o fabuloso Karl May), revistas de todo o tipo (as de mulher pelada e futebol logo vendidas), volumes de filosofia ou religião, pocket books, dicionários. Com sorte topava-se com alguma estampa Eucalol ou "O Grande e Verdadeiro Livro de São Cipriano", raridade das raridades.
Meu "clássico" continua firme no edifício Marquês do Herval, na avenida Rio Branco. Perdi as contas de quantas vezes minhas pernas, sozinhas, me levaram à Berinjela.
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