segunda-feira, agosto 19

Falha no sistema

Ele desceu resmungando a escada que o levou para o topo de uma das imensas estantes do Depósito.

— É a terceira vez esse mês que tenho que tirar Raízes do Brasil da seção de Jardinagem, Aurélia.

— Evanildo, não reclama que estou indo buscar o nosso único exemplar restante de O queijo e os vermes do andar de Culinária. Eu, hein, parece que o sistema gosta de brincar de esconde-esconde com os livros.
DariuszSankowski/Pixabay
Ele ainda deu uns dois resmungos, antes de suspirar e colocar o exemplar, surrado e devidamente protegido de maiores danos por um envelope protetor, na esteira transportadora que indicava “devolução para recadastramento”. Aurélia subiu na escada rolante e ainda teria que avançar cinco andares para chegar no setor de Culinária. O Depósito Central de Livros substituiu a Biblioteca Nacional quando o governo decretou que ninguém mais teria acesso às versões físicas das obras, tendo que se contentar com as cópias digitais disponíveis online para quem estivesse devidamente inscrito. Claro que a inscrição só era aprovada quando o cidadão cumpria certos requisitos, inclusive os de concordância ideológica, mas isso não era mais problema de Aurélia e Evanildo.
Ana Cristina Rodrigues (mais em Como os autores de ficção científica brasileiros acham que será o futuro - Aqui)

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