Os contos de O Misterioso Correspondente… se encaixariam perfeitamente em Os Prazeres e os Dias, livro publicado, com pouca repercussão, em 1896, 17 anos antes do primeiro volume de seu monumental ciclo de romances. Por que Proust não os incluiu? “Uma razão é que talvez não estivesse satisfeito com esses contos e os deixou de lado”, diz Fraisse na sede da Éditions de Fallois em Paris. “Outra razão é que metade desses contos coloca em jogo sua homossexualidade”, acrescenta. Uma terceira razão é “estética”: já havia textos que evocavam a homossexualidade em Os Prazeres e os Dias; acrescentar mais o desequilibraria.
O conto que dá título ao livro é a história de uma mulher que precisa do amor de uma amiga para se curar de uma doença mortal. Outros, como ‘A Consciência de Amá-lo’, não falam diretamente da homossexualidade, mas apresentam personagens que vivem como uma maldição sua diferença, suas “delicadezas incompreendidas”, sua vida em que “todo mundo machucará, ferirá, os que não amarem e ainda mais os que amarem”. “Os relatos mostram que, ao contrário de um de seus contemporâneos como André Gide, Proust a vive como um drama”, diz Fraisse.
Há décadas que não se publicava uma ficção inédita de Proust. A última ocorreu nos anos cinquenta. Foi o próprio Fallois que descobriu Jean Santeuil, o romance que prefigurava Em Busca do Tempo Perdido. Também o ensaio Contra Sainte-Beuve: notas sobre crítica e literatura. Desde então se publicou a correspondência do escritor. Mas não as obras de ficção que dormiam nos arquivos. Os contos de O Misterioso Correspondente… pertencem à mesma época de Os Prazeres e os Dias, obra irregular da juventude. Proust foi o anti-Rimbaud, um caso exemplar de autor que atingiu sua genialidade na maturidade, após anos de trabalhosa aprendizagem. Somente com seus contos do final do século XIX seria um autor esquecido. O Misterioso Correspondente… confirma tal afirmação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário