A primeira coisa que a gente repara são nos tons de verdes e azuis, lembrando a paleta de Cézanne (eu ia dizer que o mestre pós-impressionista se inspirou na minha terra, mas é capaz desse pessoal invejoso me acusar de bairrismo).
Do alto, não aparece a cor parda que dá nome ao rio. Nem as centenas de garças brancas que fazem seus ninhos nas árvores em volta. Mas lá está o velho Pardo, serpenteando, cortando a cidade ao meio. Boa notícia: vê-se muito verde em suas margens, de todos os tons, o que significa que há vegetação para proteger suas águas.
Gosto de imaginar que, naquele mesmo instante, um conterrâneo meio sonhador acompanha, do ponto de vista inverso, do banco da Rodoviária talvez, a passagem do avião minúsculo no céu, e imagina para onde estaria indo, se Canadá ou Bahia, Paris ou Altamira, mas a bem da verdade ele o faz brevemente, pensamentos ocupados naquela moça que não lhe dá a menor pelota e esse é todo seu tormento.
São José tem muitas subidas e ladeiras, sobes e desces, debaixo de um solão fica difícil caminhar, talvez por isso tenha tanto carro. Do alto não aparece nenhum, como não aparecem as poucas carroças que sobraram e os cachorros que insistem em dormir bem no meio da rua, inabaláveis, os carros que desviem, ora essa.
Sob esse solo, visto de tão alto, dormem muitos queridos e nascem novos. Peço aos aviões discrição, não exagerem no barulho das turbinas para não perturbar a paz do sono de nenhum deles.
Minha pequena e imensa São José, que desce, decola, voa, arremete e pousa nos pensamentos.
Vejo uma última vez a foto. Talvez este, exatamente este, seja o ponto de vista de meu pai e minha mãe, a nos olhar de onde estão, a observar nossos passos e nos guiar nos caminhos e no desvio das quebradas.
Bobagem? Sei não. Não é menos provável do que descobrir que, do alto, São José (quem diria) tem as cores de Cézanne.
Cássio Zanatta
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