domingo, fevereiro 16

Textos de ocasião

Ele nunca perguntará se ela o ama. Não se arriscará a perder a única ventura que lhe resta: a de imaginar que sim.

***

Condenados à castidade, os amores impossíveis trocam beijinhos no rosto e morrem em olor de castidade.

***


Sou do tempo em que o Café Caboclo era irmão do Açúcar União.

***

Dizemos, naturalmente, falar em nome da literatura. Embora ela, naturalmente, não concorde.

***

Um parente rancoroso murmurando ao ouvido do defunto, no velório: me chama agora de fracassado.

***

Não cheguei a ser um poeta. Fui no máximo um versejador aplicado.

***

Aos olhos da nova crítica, sonetos não são feitos nem escritos; são cometidos.

***

Sua campanha de reabilitação moral vem dando certo: já há mais de um ano ninguém lhe pergunta se ainda faz sonetos.

***

Morrer é uma prerrogativa: não morre qualquer um, só morre gente viva.

***

Conhece-te a ti mesmo, se não tens nada mais interessante a fazer.

***

Quando eu era menino, diziam-me que eu tinha certo jeito para escrever. Talvez tivesse. O que nunca tive, acho, foi o jeito certo.

***

O que dois tolos melhor sabem fazer é compartilhar o amor.

***

Que lastimáveis são certos velhos quando se põem a falar do amor, com os olhos lúbricos e a saliva aflorando aos lábios, como se estivessem numa churrascaria, diante de um pernil.

***

Era um fantasma bissexto, que mais sumia do que aparecia.

***

Um fantasma suíço sempre chega à meia-noite, nunca além ou aquém disso.

***

Sem vergonha e sem desdouro, o poeta concretista conserta agora os versos no martelinho de ouro.

***

Nos últimos tempos, quando falo comigo noto um mútuo constrangimento
Raul Drewnick

Nenhum comentário:

Postar um comentário