Kate Greenaway |
Tentou ler até lhe vir o sono, mas a leitura deixava-o ainda mais desperto. Lia livros de ciência e poesia. Gostava de poemas concisos dispostos minuciosamente no espaço branco, fiadas de marcas alfabéticas gravadas a ferro em brasa no papel. Os poemas tornavam-no consciente da sua própria respiração. Um poema desvendava a cada momento coisas em que, normalmente, não estava preparado para reparar. Eis o subtil cambiante de cada poema, pelo menos para ele, de noite, durante aquelas longas semanas, um fôlego atrás do outro, no quarto rotativo no alto do triplex.
Uma noite tentou dormir de pé na sua cela de meditação, mas não era versado que chegue, monge que chegue para consegui-lo, longe disso. Contornou o sono e fechou o círculo, alcançando o equilíbrio, uma calma sem luar em que cada força é contrabalançada por outra. Isto proporcionava-lhe o mais fugaz dos alívios, uma breve pausa no tropel das identidades irrequietas.
Não havia resposta à pergunta. Experimentou sedativos e hipnóticos mas criavam-lhe dependência, fazendo-o mergulhar dentro de si mesmo em espirais apertadas. Todos os atos por ele executados eram sintéticos e tinham a persegui-los o próprio reflexo. O pensamento mais apagado trazia consigo uma sombra ansiosa. Que fez ele? Não consultou um psicanalista sentado num cadeirão de couro. Freud já deu o que tinha a dar, Einstein quase. Naquela noite estava a ler a Teoria da Relatividade Restrita em inglês e alemão, mas por fim pousou o livro e ficou deitado, completamente imóvel, tentando mobilizar a energia suficiente para proferir a única palavra que desligaria as luzes. Nada existia à sua volta. Havia apenas o ruído dentro da sua cabeça, a mente no tempo.
Quando morresse, não acabaria. O mundo é que acabaria.
Don DeLillo, "Cosmópolis"
Nenhum comentário:
Postar um comentário