Ronald Jones |
O mecânico afirma que a viu na plataforma da estação, vendendo mingau cedo quando o trem partiu. Horas depois, ao saltar do trem na estação da cidade de Água Preta, perdeu a fala. Lá estava ela, atendendo os fregueses. Toda bonita com pano da Costa, bata de renda, figa de Guiné, pulseira de prata. Ainda sorriu para ele, como se a sua aparição ali fosse a coisa mais natural deste mundo.
O funcionário do correio ficou nervoso, quase que desmaiou ali mesmo na plataforma da estação, não querendo acreditar no que aconteceu com ele quando viajou naquele domingo para Itapira. Ia visitar um filho, que há dois anos não via, desde que casou e foi transferido do emprego no banco. Despediu-se dela na plataforma e, apressado, entrou no trem que acabava de dar três apitos fortes, anunciando que já ia partir. Da janela deu adeus e, em tom de brincadeira, pediu que ela guardasse o seu copo de mingau para quando voltasse. Quando chegou à Itapira, a primeira pessoa que viu na plataforma foi Vovó Maria Conga, que lhe estendeu a mão oferecendo o seu copo de mingau ainda quente.
Nos últimos dias, professores e alunos estão comentando muito no colégio sobre as aparições de Vovó Maria Conga. Aqui e lá longe, sem viajar, no mesmo dia, ela aparece como se fosse mesmo encantada. O padre na missa do domingo passado cuspiu cobras e lagartos. No sermão citou trechos da Bíblia que falam dos infiéis ao Cristo, o único que andou em cima das águas, multiplicou os pães e os peixes. Ameaçou de excomungar os que se deixam enganar por todo tipo de crendice e boataria inconcebível.
À pergunta ao diretor do colégio, se ele acreditava nessas aparições da preta velha, que andavam de boca em boca pelos cantos da cidade, respondeu o que achava sobre o assunto: não digo que sim, nem digo que não, ressaltando que nessas coisas esquisitas de preta velha nunca gostei de me intrometer.
De minha parte, ao escrever o breve relatório dessas aparições, apenas adianto que sempre achei que Vovó Maria Conga é uma pessoa que conhece o segredo dos caminhos e o mistério das falas, coisas vindas do seu povo, que habitava as terras longes de África. De fato, ela é uma criatura que faz a gente pensar com suas estranhezas. E admirar por sua sabedoria, velha beleza tão dela.
Cyro de Mattos
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