Carl Vilhelm Holsoe |
Releio livros e revejo filmes de que gostei muito quando li e vi pela primeira vez, mas que agora me parecem tremendamente datados, e garanto-vos que não é por não haver neles telemóveis ou computadores. É uma coisa que se sente – e até já me aconteceu com autores importantes, como Vergílio Ferreira, ou filmes muito "badalados", como American Gigolo. Mas há autores que, por mais que se vão tornando de nicho, nunca passam de moda – e é o caso de Eça de Queirós (que até se permite ser «continuado» por outras mãos no século XXI) ou Camilo Castelo Branco, que, usando embora linguagem que hoje os jovens acharão decerto rebuscada, permanece profundamente actual, como nesta passagem, em que descreve com primor um «novo-rico»:
"No Chiado abjurou um chapéu de molas de merino, e comprou outro de castor, à inglesa. Cumpria-lhe vestir as primeiras luvas da sua vida. No vesti-las arrostou com dificuldades, que venceu, rompendo a primeira luva de meio a meio. Disse-lhe a luveira que não introduzisse os cinco dedos ao mesmo tempo, e ajudou-o na árdua empresa.
Dois mancebos galhofeiros, que estavam na loja, riram indelicadamente da inexperiência do sujeito desconhecido. Um deles, confiado na inépcia tolerante do provinciano ou suposto brasileiro, disse, a meia voz, ao outro:
– Quatro pés nunca vestiram luvas.
Calisto encarou nele com sorriso minacíssimo, e disse à luveira:
– As luvas são boa coisa para a gente não dar bofetadas com as mãos."Pertence a "A Queda de Um Anjo". Que maravilha, não é?
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