Já eu era estudante universitária, e de letras, quando tive de responder a um apertado inquérito sobre as minhas leituras numa livraria-galeria das Avenidas Novas para conseguir trazer para casa Comunidade, de Luiz Pacheco. Ao que parece, era o último exemplar que existia na loja, e o livreiro decidira que só o venderia a quem o merecesse (ufa!). Mas essa atenção informada deteriorou-se muito com a industrialização da edição e a substituição das livrarias independentes por hipermercados e cadeias de lojas despersonalizadas.
Hoje em dia, não é assim tão raro termos de soletrar o nome de um autor (mesmo conhecido) para o funcionário da livraria o introduzir no computador e nos dizer se, afinal, tem ou não o livro que procuramos. E a ignorância grassa: um dia destes, mandaram-me procurar Octavio Paz na estante dos autores portugueses (lá soar soa) e há uns tempos, numa livraria do centro da capital, um senhor ao meu lado perguntou à funcionária se tinha alguma coisa de Charles Dickens e a reacção imediata dela foi: "Isso é o quê?"
Ainda apalermado com a pergunta, o cliente lá replicou: "Ó minha senhora, é um clássico." E, diante daquela explicação, a rapariga apontou então uma mesa próxima e disse-lhe: "Procure ali." Não resisti a ver o que havia na mesa: Sófocles, Ovídio, Lucrécio, Platão... Adeus, futuro.
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